Vasco Pulido Valente refere hoje, na sua crónica no PÚBLICO, os carnavais dos velhos tempos salazaristas que "metem dó"... e diz que "felizmente, a polícia de Ditadura suprimiu estas manifestações". É verdade: os carnavais até ao fim dos anos 50 implicavam, tanto quanto me permite recordar a minha memória de criança, brincadeiras inaceitáveis para os nossos padrões de hoje. Vivi até à adolescência numa vila alentejana e não esqueço uma partida de carnaval a que assisti de perto. Naquele tempo, quando se chegava à porta de alguém, não havia campainhas, mas sim uns martelos metálicos. A família A, que vivia uma porta a seguir à minha, tinha um velho contencioso com a família B (universalmente considerada antipática), que vivia no outro lado da rua. Num carnaval que a minha memória e discreção não me permitem precisar, a criada (agora diz-se empregada doméstica, mas nessa altura essa expressão pareceria de um outro planeta) da família A foi untar o martelo da porta da família B com fezes (dos A, obviamente), veio contar às crianças da rua e ficámos todos atrás das cortinas a ver quando chegava o Sr. B a casa: gritou impropérios ao perceber que tinha posto a mão em merda.
E a minha avó materna falava dos "batecus" de ainda mais antigamente: dois fulanos abordavam um sujeito indefeso, um pegava-lhe pelos braços e outro pelas pernas e faziam-no bater repetidamente com o traseiro no chão.
Mas há outra memória do carnaval daqueles tempos que tem mais elevação: as "danças". As danças eram grupos de homens que percorriam a vila, parando aqui e além, executando uma coreografia monótona mas embaladora, tendo por fundo um texto do qual não recordo uma palavra, e com muita percussão, muitas pandeiretas. Metade actuavam como homens e outra metade travestidos de mulheres, lábios pintados de encarnado e maquilhados com enormes rosetas nas faces. As pessoas diziam "vamos ver as danças", ou "vem aí a dança", e tudo parava a ver e escutar. Provavelmente tratava-se da sobrevivência de um ritual medieval, que poderia fazer as delícias de antropólogos sem assunto e motivar alguma tese de mestrado ou doutoramento mais interessante do que muitas. Talvez existam estudos sobre o assunto, mas não os não conheço. Garanto, eu vi as danças, da minha janela, muitos anos atrás, quando era tão pequeno que não me deixavam sair à rua sozinho.
domingo, fevereiro 26
sexta-feira, fevereiro 24
Palavras e expressões de que não gosto
nomeadamente
designadamente
ensino-aprendizagem (ou é com barra?)
flexibilidade curricular
atitudes, competências, cidadania (quando utilizadas nos textos do ministério ou dos chamados especialistas da educação ou a propósito do "movimento" de Manuel Alegre)
territórios educativos
dificuldades educativas acrescidas
escola inclusiva
processo de bolonha (Bolonha é uma bela cidade que não tem culpa)
em sede de
moldura penal
assistente (quando utilizada num processo jurídico)
Há mais. Estas são as que me ocorrem em primeiro lugar. Fica aqui o apelo ao Lino2 para indicar as suas escolhas, mas que isso não seja desculpa para se atrasar com a blognovela. Já agora, gostava também de conhecer as listas do ON e do OMWO do Prozacland (link ao lado).
designadamente
ensino-aprendizagem (ou é com barra?)
flexibilidade curricular
atitudes, competências, cidadania (quando utilizadas nos textos do ministério ou dos chamados especialistas da educação ou a propósito do "movimento" de Manuel Alegre)
territórios educativos
dificuldades educativas acrescidas
escola inclusiva
processo de bolonha (Bolonha é uma bela cidade que não tem culpa)
em sede de
moldura penal
assistente (quando utilizada num processo jurídico)
Há mais. Estas são as que me ocorrem em primeiro lugar. Fica aqui o apelo ao Lino2 para indicar as suas escolhas, mas que isso não seja desculpa para se atrasar com a blognovela. Já agora, gostava também de conhecer as listas do ON e do OMWO do Prozacland (link ao lado).
quinta-feira, fevereiro 23
As ruas de Teerão
Já me referi a um aspecto irritante dos noticiários de tv que ontem voltou a repetir-se. Num telejornal da noite foram mostradas imagens encenadas em Teerão da habitual queima de bandeiras em frente de embaixadas ocidentais. O que se via era um pequeno grupo de figurantes filmado à altura do operador de câmara, mas o locutor falava de "ruas cheias em Teerão".
Este modo acrítico de reproduzir os materiais provenientes de países onde as manifestações são encenadas pelo poder e por grupos extremistas pode dever-se a desleixo e incompetência, mas também podemos perguntar-nos se não terá a ver com posições políticas, dentro das redacções, daqueles que nunca deixaram de viver uma longa paixão por tudo o que é regime totalitário.
(Cartoon de Mike Luckovich, Atlanta Journal)
domingo, fevereiro 19
A ciência
Eu, como certamente os meus 7 ou 8 leitores, temos alguma noção de que a queda de uma maçã e os movimentos dos planetas têm uma causa universal comum. Ou das intimidades entre campo eléctrico e campo magnético. Mas, francamente, se me perguntassem em que aspectos ficam afectadas as mulheres atingidas por doença que levou à ablação de um seio, eu provavelmente responderia, depois de um esforço grande: sei lá, talvez na capacidade de cozinhar ou de conduzir um automóvel. Felizmente ontem à noite o telejornal da RTP1 veio abrir-me os olhos: foi divulgado um estudo do Instituto Superior de Psicologia Aplicada onde se concluía que afinal aquelas senhoras ficam afectadas mas é na auto-estima, na relação com o corpo e na sexualidade.
Se não fosse a ciência, o que seria a nossa visão do mundo?
Se não fosse a ciência, o que seria a nossa visão do mundo?
sábado, fevereiro 18
O amor nos tempos de internet (8)
O primeiro sinal da fuga iminente de Sofia, a que verdadeiramente não prestei atenção, surgiu pouco depois da Páscoa do ano passado. Ela tinha começado nesse ano a dar um curso de formação noutra empresa fora de horas. As aulas terminavam às 11 da noite e costumava chegar a casa entre as 11.15 e as 11.20. Certa noite do fim de Abril, eu estava muito cansado e deitei-me antes de ela chegar. Adormeci pesadamente mas acordei passado pouco tempo. Estendi o braço e toquei na ausência de Sofia. Acendi a luz, vi que passava da meia noite. Levantei-me a correr, e quando confirmei que não estava corri para o telemóvel. A chamada foi recusada, mas passado um minuto a chave rodava na porta.
Que foi, amor? Perguntei, já estava assustado. Os alunos hoje retiveram-me imenso tempo depois da aula, explicou, tranquilizante. Gerou-se uma discussão enorme à volta de um problema prático que confundiu a turma toda. Cortei-te a chamada porque não valia a pena gastares o impulso, já estava na garagem. Abraçou-me e beijou-me de fugida e passados menos de dez minutos estávamos a adormecer abraçados, como era hábito. Mas, meses mais tarde, este episódio iria ser revisto por mim como o primeiro sintoma do que estava a preparar-se. Embora sem voltar a falar nisso, fiquei com a certeza de que, naquela noite, Sofia tinha estado com o outro, talvez apenas num passeio nocturno a seguir à aula, talvez algo mais.
No início de Maio o comportamento de Sofia começou a chamar-me a atenção. Um domingo de manhã, num fim de semana quente que o Eduardo não tinha vindo passar connosco, estava ela no escritório a folhear dossiers e eu entrei para lhe perguntar, como era hábito, o que íamos fazer. Ela levou instintivamente a mão ao telemóvel que estava em cima da secretária. Foi um gesto muito rápido, inconsciente, indício de um receio comprometido. Este sinal perturbou-me, mas por ser isolado não me entretive a dar-lhe importância. Depois de almoço passeámos longamente costa do Alentejo abaixo e mergulhámos em Melides. No regresso jantámos num restaurante da estrada, a caminho de Comporta, frente à planície e ao pôr do sol com uma luz magnífica feita de vermelhos e azuis-cinzentos. Como sempre, foi a Sofia que escolheu com prazer o vinho. Quando brindámos disse, também como era hábito: À tua, meu querido, muitos anos de vida para me fazeres feliz.
Semanas mais tarde, esta cena iria intrigar-me. O dia havia de ser depois recordado como o último em que tinha estado na praia com Sofia. Talvez ela não quisesse, de facto, deixar-me, mas alguma coisa mais forte do que a sua vontade já tinha posto em marcha o golpe de ruptura.
O aviso final surgiu no fim de Maio. A aula de formação à sexta-feira terminava às dez da noite. Eu ficava a trabalhar até mais tarde e ia buscá-la para jantar fora. Dessa vez não aconteceu, e não voltaria a acontecer. Na véspera à noite tinha-me dito: A minha mãe tem insistido tanto para eu ir lá, por causa do problema da casa... estou a pensar ir lá jantar amanhã, importas-te? Senti um golpe interior e reagi sem grande firmeza. Oh, mas porquê mesmo amanhã? Porque já não os vejo há bastante tempo e também lá está amanhã o meu irmão, a justificação veio pronta, mostrando que a decisão estava tomada. Como as relações com os meus sogros eram geladas, para usar um eufemismo, nada do que acontecesse nessa sexta seria fácil de verificar. Deitei-me às duas, sem Sofia e sem sono.
Que foi, amor? Perguntei, já estava assustado. Os alunos hoje retiveram-me imenso tempo depois da aula, explicou, tranquilizante. Gerou-se uma discussão enorme à volta de um problema prático que confundiu a turma toda. Cortei-te a chamada porque não valia a pena gastares o impulso, já estava na garagem. Abraçou-me e beijou-me de fugida e passados menos de dez minutos estávamos a adormecer abraçados, como era hábito. Mas, meses mais tarde, este episódio iria ser revisto por mim como o primeiro sintoma do que estava a preparar-se. Embora sem voltar a falar nisso, fiquei com a certeza de que, naquela noite, Sofia tinha estado com o outro, talvez apenas num passeio nocturno a seguir à aula, talvez algo mais.
No início de Maio o comportamento de Sofia começou a chamar-me a atenção. Um domingo de manhã, num fim de semana quente que o Eduardo não tinha vindo passar connosco, estava ela no escritório a folhear dossiers e eu entrei para lhe perguntar, como era hábito, o que íamos fazer. Ela levou instintivamente a mão ao telemóvel que estava em cima da secretária. Foi um gesto muito rápido, inconsciente, indício de um receio comprometido. Este sinal perturbou-me, mas por ser isolado não me entretive a dar-lhe importância. Depois de almoço passeámos longamente costa do Alentejo abaixo e mergulhámos em Melides. No regresso jantámos num restaurante da estrada, a caminho de Comporta, frente à planície e ao pôr do sol com uma luz magnífica feita de vermelhos e azuis-cinzentos. Como sempre, foi a Sofia que escolheu com prazer o vinho. Quando brindámos disse, também como era hábito: À tua, meu querido, muitos anos de vida para me fazeres feliz.
Semanas mais tarde, esta cena iria intrigar-me. O dia havia de ser depois recordado como o último em que tinha estado na praia com Sofia. Talvez ela não quisesse, de facto, deixar-me, mas alguma coisa mais forte do que a sua vontade já tinha posto em marcha o golpe de ruptura.
O aviso final surgiu no fim de Maio. A aula de formação à sexta-feira terminava às dez da noite. Eu ficava a trabalhar até mais tarde e ia buscá-la para jantar fora. Dessa vez não aconteceu, e não voltaria a acontecer. Na véspera à noite tinha-me dito: A minha mãe tem insistido tanto para eu ir lá, por causa do problema da casa... estou a pensar ir lá jantar amanhã, importas-te? Senti um golpe interior e reagi sem grande firmeza. Oh, mas porquê mesmo amanhã? Porque já não os vejo há bastante tempo e também lá está amanhã o meu irmão, a justificação veio pronta, mostrando que a decisão estava tomada. Como as relações com os meus sogros eram geladas, para usar um eufemismo, nada do que acontecesse nessa sexta seria fácil de verificar. Deitei-me às duas, sem Sofia e sem sono.
Da vida real
Ilan Hilami, 23 anos, trabalhava numa loja de telemóveis na área de Paris. Uma jovem cliente assídua conquista-lhe a simpatia e um dia convida-o para tomar um copo. O convite é uma armadilha: Ilan é raptado por um bando de delinquentes, chefiado por Youssef Fofana, que pedem um resgate de 450 000 euros. A mãe de Ilan não tem meios de fazer face ao resgate. O corpo de Ilan, com mostras evidentes de tortura, apareceu no passado dia 13.
Ilan era judeu. Youssef é muçulmano.
Ilan era judeu. Youssef é muçulmano.
Os moderados existem
"É uma ironia que hoje viva num estado democrático europeu e tenha que lutar contra os mesmos fanáticos religiosos de que fugi no Irão há anos". Palavras de Kamran Tahmasebi, refugiado na Dinamarca desde 1989. O caso das caricaturas levou-o a levantar a voz contra os imams na Dinamarca, que afirma prejudicarem a o processo de integração e constituirem um dos maiores problemas que o país enfrenta. Sabe bem que enfrenta riscos sérios, mas envolveu-se na dinamização de uma Rede de Muçulmanos Moderados.
Alguns responsáveis ocidentais ajoelham-se e pedem desculpas aos que têm comportamentos violentos e inadmissíveis contra o nosso modo de vida. Costumam invocar a distinção entre muçulmanos moderados e extremistas. Na verdade, estão a pedir desculpas aos extremistas, e é provável que não acreditem na existência dos tais moderados. Se acreditassem, deveriam ter em conta que a atitude capitulacionista é, antes de mais, uma bofetada aos que têm apreço pelos nossos valores, independentemente da sua origem ou credo.
Alguns responsáveis ocidentais ajoelham-se e pedem desculpas aos que têm comportamentos violentos e inadmissíveis contra o nosso modo de vida. Costumam invocar a distinção entre muçulmanos moderados e extremistas. Na verdade, estão a pedir desculpas aos extremistas, e é provável que não acreditem na existência dos tais moderados. Se acreditassem, deveriam ter em conta que a atitude capitulacionista é, antes de mais, uma bofetada aos que têm apreço pelos nossos valores, independentemente da sua origem ou credo.
sexta-feira, fevereiro 17
Cinco manias - resposta
Finalmente respondo ao ON do Prozacland, após um esforço (fácil) para identificar 5 manias confessáveis:
1ª dormir cedo e com duas gretas do estore abertas
2ª jantar num restaurante pelo menos um dia por semana
3ª ir de preferência às sessões de cinema das 18 ou 19 (para evitar adormecer quando o filme não presta)
4ª ler novelas no original quando conheço a língua
5ª comprar cds com versões de canções de Cole Porter, quando os descubro
1ª dormir cedo e com duas gretas do estore abertas
2ª jantar num restaurante pelo menos um dia por semana
3ª ir de preferência às sessões de cinema das 18 ou 19 (para evitar adormecer quando o filme não presta)
4ª ler novelas no original quando conheço a língua
5ª comprar cds com versões de canções de Cole Porter, quando os descubro
quinta-feira, fevereiro 16
Homens, mulheres e fantasmas
quarta-feira, fevereiro 15
Liberdade de expressão armadilhada
É curioso como os meios de informação com maior impacto frequentemente malbaratam a liberdade de expressão e a independência que seriam supostos possuir.
Repare-se, por exemplo, nas referências ao Irão durante a crise actual. Fala-se, claro, no enriquecimento de urânio, que é notícia. Mas não me recordo de ter ouvido ou visto nada sobre a recente greve de motoristas em Teerão, que desencadeou uma vaga de prisões e repressão sobre as famílias dos organizadores do protesto. Parece que a direcção da associação de motoristas pede a solidariedade de sindicatos franceses.
Há também rumores de que as comemorações do 27º aniversário da revolução islâmica esbarraram na falta de entusiasmo da população, não tendo havido multidão para mostrar nas ruas.
Entretanto, Amir Abbas Fakhravar, proeminente dissidente que actualmente vive escondido, deu uma entrevista à National Review Online.
Estas notícias podem requerer confirmações e investigação. Mas que fazem, por exemplo, as televisões? Em termos de imagem, limitam-se a passar as violências e queimas de bandeiras junto a embaixadas ocidentais em Teerão: encenações rombas, risíveis, com umas dezenas de figurantes inexperientes que fariam o fracasso de qualquer filme comercial. Ora, quem põe no ar as imagens não é ingénuo. Podemos concluir que há entre nós muita gente que assume com naturalidade o papel de porta voz do regime teocrático.
Repare-se, por exemplo, nas referências ao Irão durante a crise actual. Fala-se, claro, no enriquecimento de urânio, que é notícia. Mas não me recordo de ter ouvido ou visto nada sobre a recente greve de motoristas em Teerão, que desencadeou uma vaga de prisões e repressão sobre as famílias dos organizadores do protesto. Parece que a direcção da associação de motoristas pede a solidariedade de sindicatos franceses.
Há também rumores de que as comemorações do 27º aniversário da revolução islâmica esbarraram na falta de entusiasmo da população, não tendo havido multidão para mostrar nas ruas.
Entretanto, Amir Abbas Fakhravar, proeminente dissidente que actualmente vive escondido, deu uma entrevista à National Review Online.
Estas notícias podem requerer confirmações e investigação. Mas que fazem, por exemplo, as televisões? Em termos de imagem, limitam-se a passar as violências e queimas de bandeiras junto a embaixadas ocidentais em Teerão: encenações rombas, risíveis, com umas dezenas de figurantes inexperientes que fariam o fracasso de qualquer filme comercial. Ora, quem põe no ar as imagens não é ingénuo. Podemos concluir que há entre nós muita gente que assume com naturalidade o papel de porta voz do regime teocrático.
terça-feira, fevereiro 14
De vez em quando também se distraem...
... os guardiões da linguagem politicamente correcta. Ainda não ouvi mencionar o dia dos namorados e das namoradas. Imperdoável!
segunda-feira, fevereiro 13
O lugar do mas
A crise dos cartoons veio, curiosamente, exigir clarificação de posições políticas no que toca ao tema muito sensível da liberdade de expressão e desmascarar hipocrisias que costumavam passar despercebidas sob o manto do progressismo, sobretudo no campo da esquerda órfã do Muro.
A linha divisória não é entre esquerda e direita, conceitos vagos e inapropriados, mas, no caso concreto, entre os que defendem a liberdade de expressão mas compreendem - quando não justificam - a susceptibilidade dos sentimentos religiosos e as reacções dos fanáticos que fazem ameaças de morte, e os que reconhecem o direito ao protesto e às suas consequências em estado de direito mas põem em primeiro lugar a defesa da liberdade de expressão. Tudo depende, como se vê, do lugar que as frases ocupam em relação à palavrinha adversativa.
Na prática, a piedosa tolerância para com os sentimentos religiosos exibida pelos sectores da esquerda empedernida e todos os que, noutras esferas políticas, por aqueles têm sido contagiados, só se manifesta, como se vê, quando a religião ofendida é a mesma que obriga a vestir burkas, apedrejar mulheres e que, numa palavra, prega a condenação à morte dos apóstatas e infiéis. Se se tratasse de uma posição de princípio, motivos não teriam faltado para que os mesmos se fizessem ouvir entre nós em muitas ocasiões. Pelo que podemos concluir que, dependendo do que lhes convém, ora gritam A mas B, ora sussurram B mas A.
A linha divisória não é entre esquerda e direita, conceitos vagos e inapropriados, mas, no caso concreto, entre os que defendem a liberdade de expressão mas compreendem - quando não justificam - a susceptibilidade dos sentimentos religiosos e as reacções dos fanáticos que fazem ameaças de morte, e os que reconhecem o direito ao protesto e às suas consequências em estado de direito mas põem em primeiro lugar a defesa da liberdade de expressão. Tudo depende, como se vê, do lugar que as frases ocupam em relação à palavrinha adversativa.
Na prática, a piedosa tolerância para com os sentimentos religiosos exibida pelos sectores da esquerda empedernida e todos os que, noutras esferas políticas, por aqueles têm sido contagiados, só se manifesta, como se vê, quando a religião ofendida é a mesma que obriga a vestir burkas, apedrejar mulheres e que, numa palavra, prega a condenação à morte dos apóstatas e infiéis. Se se tratasse de uma posição de princípio, motivos não teriam faltado para que os mesmos se fizessem ouvir entre nós em muitas ocasiões. Pelo que podemos concluir que, dependendo do que lhes convém, ora gritam A mas B, ora sussurram B mas A.
sábado, fevereiro 11
Os nossos valores estão a ser espezinhados. Exigimos desculpas
Sonia Mikish exige desculpas a governos de países onde os nossos valores não são respeitados.
I feel offended.
Zealots are nailing veils onto the faces of my sisters in Afghanistan and Pakistan and are busy hanging women, homosexuals, adulterers and non-believers.
But human rights, women's rights and the right to liberty are the most exalted in the history of humanity; this is the tradition in which I was raised. Values that make the world better and more peaceful.
I demand that the governments of Saudi Arabia, Palestine, Indonesia and Egypt apologise to me. Otherwise I am unfortunately forced to threaten, beat up, kidnap or behead their citizens. Because I am somewhat sensitive about my cultural identity. (...)
Artigo publicado em Die Tageszeitung, 6 de fevereiro.
I feel offended.
Zealots are nailing veils onto the faces of my sisters in Afghanistan and Pakistan and are busy hanging women, homosexuals, adulterers and non-believers.
But human rights, women's rights and the right to liberty are the most exalted in the history of humanity; this is the tradition in which I was raised. Values that make the world better and more peaceful.
I demand that the governments of Saudi Arabia, Palestine, Indonesia and Egypt apologise to me. Otherwise I am unfortunately forced to threaten, beat up, kidnap or behead their citizens. Because I am somewhat sensitive about my cultural identity. (...)
Artigo publicado em Die Tageszeitung, 6 de fevereiro.
quarta-feira, fevereiro 8
Os respeitos e o medo
É lugar comum comentar, a propósito das fricções entre o mundo ocidental e o mundo islâmico, que os muçulmanos não são todos terroristas e nem todos se deixam guiar pelos incitamentos à violência por militantes, agitadores e governos radicais.
Eu estou de acordo com o pressuposto. Quero até acreditar que uma parte muito importante da população de países islâmicos, uma parte com potencialidades para desempenhar um papel activo na transformação política dos respectivos regimes, partilha apreço por valores ocidentais e gostaria de poder usufruir deles nos seus países.
Então a quem servem os constantes "reconhecimentos de erros", auto-humilhações e pedidos de desculpa dos porta-vozes ocidentais face à ameaça ululante de quem queima e assassina? Não, certamente, aos que no mundo islâmico gostariam de poder lutar por mais abertura e liberdade. Claro que também não creio que os nossos timoratos líderes que se ajoelham queiram servir os radicais: simplesmente, perante a sua fúria, tremem de medo. É nisto que estamos.
Eu estou de acordo com o pressuposto. Quero até acreditar que uma parte muito importante da população de países islâmicos, uma parte com potencialidades para desempenhar um papel activo na transformação política dos respectivos regimes, partilha apreço por valores ocidentais e gostaria de poder usufruir deles nos seus países.
Então a quem servem os constantes "reconhecimentos de erros", auto-humilhações e pedidos de desculpa dos porta-vozes ocidentais face à ameaça ululante de quem queima e assassina? Não, certamente, aos que no mundo islâmico gostariam de poder lutar por mais abertura e liberdade. Claro que também não creio que os nossos timoratos líderes que se ajoelham queiram servir os radicais: simplesmente, perante a sua fúria, tremem de medo. É nisto que estamos.
quinta-feira, fevereiro 2
Dinamarca, Alemanha, Noruega, França
Aguarda-se que, em solidariedade, se façam ouvir as vozes dos destemidos que gostam de caricaturar símbolos religiosos, quando se trata da igreja católica. Afinal publicar desenhos do papa com preservativo no nariz é tão fácil como um passeio na Avenida.
quarta-feira, fevereiro 1
Recado a Odete
No forum tsf de hoje (que contou, diga-se de passagem, com algumas intervenções hilariantes, entre as quais a de um médico, se não erro) Odete Santos, perguntada sobre a posição do PCP sobre o casamento de pessoas do mesmo sexo, apontou o caso português como muito complicado, devido ao pretenso moralismo de natureza judaico-cristã (cito de cor, não garanto que as palavras exactas tenham sido estas). Odete não deve ter reparado que os países onde aquela forma de casamento está reconhecida são todos de cultura judaico-cristã. Esqueceu-se também de mencionar a lista dos países com regimes comunistas ou aparentados, ou que já os tiveram, onde duas pessoas do mesmo sexo podem casar à vontade.
A ausência de utopia
Porque está o liberalismo em recuo na América Latina? Artigo de Hector Ñaupari aqui.
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