domingo, julho 22

Puig (1932-1990)

Hoje passam 22 anos sobre a morte, infelizmente prematura, de Manuel Puig. Não será um génio da literatura mas é um dos autores contemporâneos mais talentosos. Já evoquei noutro post uma das suas obras mais interessantes, Boquitas Pintadas. Das outras, escolho sem hesitar Cae la Noche Tropical, Sangre de Amor Correspondido, La traición de Rita Hayworth e The Buenos Aires Affair.

Puig é um mestre contador de histórias caracterizadas pelo falso kitsch, pelo folhetinesco carregado de significados, segredos, enigmas e sentimentos, pela não trivialidade da narrativa, trabalhada com a precisão e a perícia de um artífice dedicado, e pela  construção de alguns dos diálogos mais fluentes, eficazes e verosímeis que se podem encontrar na literatura recente. As personagens, umas frágeis e outras cruéis, destilam paixões, frustrações, medos e perfídia em enredos credíveis como a vida de todos os dias.

Algumas obras estão traduzidas em português. Fica aqui a sugestão para leitura de férias.

sábado, julho 21

Batman in Aurora

A cidade que a Forbes classificou em 9º lugar como a mais segura dos Estados Unidos acaba de entrar na lista dos massacres urbanos de que Columbine se tornou símbolo.
A dose de intriga repete-se. Que motivações fizeram agir o rapazola vestido de Joker que não chamava a atenção de ninguém? Os psico-explicadores servem através dos jornais e tvs as conjecturas habituais. No fim, sabemos pouco. James Holmes falhara nos exames do curso de doutoramento em neurociências. Actuou só. Não se lhe conhece ligação a grupos terroristas ou ideologias extremistas. Não temos alternativa: a sua masculinidade falhada fez-se substituir pela alta violência, tosca mimetização do comportamento macho, quando o desempenho sexual permanece por resolver.
Será? Há afirmações que não podem ser demonstradas. Aqui vai mais uma: a cena não poderia ocorrer na estreia de outros filmes recentes, como The Queen of Versailles, The Well Digger's Daughter, Magic Mike.

sexta-feira, julho 20

Los recortes

O actor milionário Javier Bardem ontem, em Madrid, interpretando um indignado com o aumento do IVA.
Palco e holofotes à parte, Espanha agita-se e recusa ser aquilo em que se tornou.

Foto e notícia no El País.

quarta-feira, julho 18

Comprar tempo

É sabido que na vida em geral e em alguns sectores de actividade também, o tempo é um bem precioso porque escasso. A falta de tempo pode ser mais dramática do que a falta de dinheiro, sobretudo para quem tem dinheiro à disposição.

Em Madrid, uma empresa começa hoje a admitir colaboradores vocacionados para dar tempo a quem não o tem, tanto para tarefas de rotina como para extravagâncias. Comprar uma prenda, remendar o fundo de umas calças, cozinhar paella, fazer uma declaração de amor - são os desafios que poderão vir a colocar-se aos novos profissionais: os "solucionadores" vão estar aí para resolver os pequenos ou grandes problemas que as agendas carregadas deixam sem solução.

Aguarda-se que a ideia alastre por aí.

Rui Rio em Vigo

sexta-feira, julho 13

A presumível inocência dos tontos

No passado dia 6, os jornais contavam que o suspeito de roubo do Códice Calixtino, em Santiago de Compostela, tinha sido preso, e que conjuntamente tinham sido presos preventivamente os seus mais directos famliares, esposa e filho.
A respeito do caso Nóos, em que se investiga o desvio de mais de 5 milhões de euros de fundos públicos eonde  a presumida actuação delituosa de Urdangarin está em foco, o tribunal de Palma de maiorca acaba de recusar a imputação da Infanta Cristina, esposa de Urdangarin. É notícia de hoje.

Poder-se-á cair na tentação de dizer: lá como cá, a justiça não é independente e defende os mais poderosos. Mas isso é a maledicência comum. Os tribunais é que têm inteiro conhecimento da causa, o que lhes permite tomar decisões tão acertadas quanto possível. Eu deduzo, simplesmente, que o juiz de Santiago teve razões para crer que a mulher e o filho do então suspeito não são tontinhos e percebem o que se passa lá em casa.

quinta-feira, julho 12

"Não podemos escolher"

Não temos essa liberdade.
São frases de Mariano Rajoy, ontem, reconhecendo que já não governa, se é que governou alguma vez. Os cidadãos (ou súbditos? ou administrados?) espanhois assistem atónitos ao esvaziamento do poder político que se tinham dado ao trabalho de eleger, à deslocação do centro que decide para muito longe, uma espécie de big-brother longínquo que por economia de explicações se designa por "bruxelas".
Sempre bem dispostos, entretanto, a dar cognomes aos seus putativos governantes. José Luís era zETAp ou Zetaparo. Mariano já foi Mariasno, hoje já é Ruinajoy.

terça-feira, julho 10

Misérias da ficção

José Luis Corral, especialista em história medieval e novelista, ficcionou a saga do desaparecimento do Códice Calixtino num livro recente onde, com um padrão de enredo muito em voga e cansativo, talvez à la danbrown, os maus são um grupo ultraortodoxo da Igreja.

Corral mostra-se desiludido com a realidade e teima em ver apenas a ponta do iceberg nos factos revelados na última semana. Como é que um aparentemente pacato electricista pode usurpar o papel da organização sinistra que ele tinha inventado?

A realidade, tanto quanto me apercebo, deve estar também desiludida com Corral. Como contou o arguto juiz instrutor, o electricista Manuel Fernández Castiñeiras é uma pessoa astuta. Nem a mulher, que sabia que ele roubava dinheiro, estava ao corrente da subtracção do Códice. Parece que o protagonista da versão real já tinha arrecadado uns euros da Igreja, na ordem do milhão, e prossegue a investigação sobre as suas contas. Mas tinha um comportamento reservado e modesto. A sua maior preocupação de momento era a reparação do seu velho automóvel, que iria custar uns 2000 euros. São estas pessoas simples, discretas, que iludem não só as esposas como também os romancistas distraidos.

No estado actual da história, tudo indica que o Códice não foi objecto de transacções, nem extorsões, nada, nem luvas... refiro-me a luvas reais, daquelas de pôr nas mãos, porque nas fotos publicadas todos pudemos ver arcebispos e primeiros-ministros a folhear enternecidamente o milenário  livro com as mãos que Deus lhes deu. Algo estará por contar, e o que falta é com certeza mais interessante do que as ficções que ainda cairão em tentações de se dar a ver.

domingo, julho 8

Vem aí a praia


Chegou o fato de banho à prova de lúbricos. Está tudo contado no Daily Mail. Desenhado por Crystal Huyben, é o ideal para as mulheres que pensam que a sexualidade é um admirável dom de Deus e desejam preservar a sacralidade do corpo para o marido.

A ideia pode ter acolhimento em variadíssimos nichos de mercado. Aguardo impaciente o lançamento da peça correspondente em moda masculina. Todos aqueles a quem anos de maçada no ginásio não desenvolveu "six-packs" nem, pior do que isso, encurtou o abdómen, ficarão gratos. Já para não mencionar os esbranquiçados que só grelham sem bronzear e continuam tão inapresentáveis no verão como no inverno. Vá lá, estilistas, sigam o exemplo da Crystal Huyben, despachem-se, alguém tem de fazer alguma coisa.

Zócalo

Não vai ser tão falada como Tahir, mas a grande praça da cidade do México encheu-se ontem de indignados com os resultados das eleições. Os que perderam falam de farsa, de compra de votos (onde até uma cadeia de supermercados parece envolvida) e de urnas com votação acima dos 100%. Apoiantes dos principais partidos, PRD, PAN e PRI, esgrimem para já nos comentários dos jornais. Mas tudo indica que o pó há-de assentar e os mexicanos vão viver com o novo presidente, actual marido da popular Angélica Rivera, estrela de telenovelas, e nos próximos seis anos gozarão a felicidade possíve.l