terça-feira, maio 18

Evo e Benedito




O que o Papa tem que aturar. Um solteirão empedernido, que faz da sua irmã Esther a primeira dama do país, que declarou estar casado com a Bolívia porque precisa de ter todo o tempo para se dedicar à pátria, vem recomendar a Benedito XVI o fim do celibato na Igreja. Foi anteontem, no Vaticano, em que Evo teve 25 minutos de tempo de antena.

domingo, maio 16

Da cinzenta literatura

Pachauri teve o seu primeiro encontro com a comissão de revisão do relatório do IPCC. Defendeu que não se pode deixar de ter em conta a literatura "cinzenta", criada fora do sistema convencional de validação científica.

Não sei se sim ou não. Engraçado, no entanto, vindo do responsável de uma vasta equipa que invocou o sistema de revisão pelos pares não só para fazer passar um ponto de vista cada vez mais desacreditado publicamente, como para silenciar e banir do sistema as vozes discordantes.

Mas isto não interessa nada. Simplesmente, levou-me de link em link a conhecer uma faceta de Pachauri que ignorava por completo: o homem dedica-se mesmo à literatura. Publicou no início deste ano o seu primeiro romance, Return to Almora, que as badanas podem descrever assim:

For Sanjay Nath, life is calling. Literally. Haunted by the remembrances of his previous life, spent at Almora, Sanjay starts to long and more to return to his ‘home land.’ The usual mundane progression of life fails to keep him busy, and moved by personal tragedies and futility of human life, he ultimately gives up everything to chase meaning, memories, and peace.

Parece pouco sumarento como resumo, mas procurando encontra-se melhor. O livro tem um cunho autobiográfico e conta a história de Sanjay, um homem com preocupações ambientais e que já em criança surpreendera os pais ao revelar que a sua esposa na encarnação anterior ainda era viva. Narra a entrada na universidade, a perda da virgindade, a "possessão por uma lascívia nunca antes sentida"; mais tarde, o encontro com Shirley MacLaine (a própria) e a atracção incontrolável pelas mamas das alunas na universidade. O Telegraph ofereceu alguns excertos da prosa:

Afterwards she held him close. ‘Sandy, I’ve learned something for the first time today. You are absolutely superb after meditation. Why don’t we make love every time immediately after you have meditated?’

Sanjay saw a shapely dark-skinned girl lying on Vinay’s bed. He was overcome by a lust that he had never known before … He removed his clothes and began to feel Sajni’s body, caressing her voluptuous breasts.


mas desgraçadamente...

the excitement got the better of him, before he could even get started.

He enjoyed the sensation of gently pushing Susan’s shoulders back a few inches, an action that served to lift her breasts even higher (...) He was excited by the sight of her heaving breasts, as she breathed in and out deeply.

Por acaso até consta que o lançamento do livro na Índia teve o patrocínio de grandes empresas a quem o TERI, instituto que Pachauri dirige, tem atribuído prémios e distinções, e também de um Banco que já em 2007 tinha apontado as alterações climáticas como uma das áreas-chave de investimento no futuro e que, compreensivelmente, tem subsidiado estudos de climatologia.

Como humilde espectador sem autoridade para avaliar a literatura sobre o clima, tenho de me limitar às minhas intuições para escolher os pontos de vista que julgo credíveis e formar o meu julgamento pessoal sobre o que se esconde por trás das deixas de quem fala. Também não faço crítica literária e muito menos a partir de meia dúzia de linhas, mas a impressão que fica é que não iria perder tempo a ler uma página sequer do livro. Claro que um cientista não tem que ser um bom escritor de romances, mas Pachauri acaba por sugerir, talvez sem dar conta, por intermédio da sua vida real, um enredo fascinante para um thriller: um bando de magnatas e especuladores aparecem a apoiar a novela de qualidade duvidosa de um escritor medíocre - o leitor não despegará do livro até saber porquê.

sexta-feira, maio 14

Vale tudo


And good's bad today,
And black's white today,
And day's night today.

quarta-feira, maio 12

O poder das forças exteriores

Que sorte que Obama não telefonou a Sócrates. Ainda iam tirar a alguém os 2,9% que sairam no bazar pré eleitoral.

terça-feira, maio 11

Poderes da fé



A majority of Roman Catholics in the United States are critical of the way Pope Benedict XVI and the Vatican have handled the reports of sexual abuse by priests, but have confidence in the Vatican to make changes to prevent abuse in the future, according to a New York Times/CBS News poll released Tuesday. (NY Times, 4 de Maio.)

Bem sei que hoje em dia toda a gente sabe inglês mas depois de ler o artigo apetece-me fazer uma tradução livre enriquecida:

Apesar de termos dado o nosso melhor para deitar abaixo o Papa Benedito XVI, a maioria dos católicos nos EEUU, tendo embora uma visão crítica do modo como ele e o Vaticano lidaram com as acusações de abuso sexual por padres, mantêm confiança nas instituições da Igreja e não parecem pretender abandoná-la em número significativo.

Assim, 64% dos inquiridos na nossa recente sondagem acham que a Igreja tem tido da parte dos media um tratamento mais duro do que o dado a outras religiões; 79% declaram intenção de manter as contribuições financeiras para a Igreja, 82% não terão as suas práticas religiosas afectadas e lamentavelmente apenas 9% admitem colocar a questão de deixar a Igreja. A liderança do actual papa é vista positivamente por 43% da amostra, sendo 17% os que a vêem com desfavor.


Não fico nada surpreendido com estes resultados. No nosso país assistimos nos anos recentes, na esfera laica da sociedade, a episódios com alguma semelhança (salvaguardadas as diferenças de alcance e dimensão), que não tiveram efeitos visíveis no apoio popular a determinado grupo político.

A imagem do papa, para os católicos, vai buscar os seus fundamentos bem para além do homem circunstancial. Como a adesão a um partido, ideologia ou grupo tem as suas raizes em algo imaterial que transcende a importância dos executantes do momento. Elas dão substância ao "eu" que acredita.* Por isso, renunciar a uma crença poderá doer tanto como perder um bocado de nós. Se é verdade que sem fé não há explicações que cheguem para nada, em presença da fé qualquer explicação é supérflua.


*Coisa que Benedito contraditoriamente finge não compreender, ao declarar em Lisboa que espiritualidade não é do domínio privado.

domingo, maio 9

HI(V)PÓTESES

Na página de entrada do Medical Hypotheses ainda está o nome de Bruce Charlton como editor. Talvez por pouco tempo. A Elsevier, que edita o jornal, pretende que seja adoptado o sistema de revisão pelos pares -- o que até aqui não acontecia, fazendo deste periódico um lugar de acolhimento à extravagância. O objectivo seria o de dar voz a ideias "radicais" ou "revolucionárias". O conteúdo parece ter qualidade muito desigual, e a verdade é que sob a direcção de Charlton o jornal mais que duplicou o seu factor de impacto (actualmente acima de 1.4).

Mas Charlton terá ido longe demais ao aceitar para publicação, em dois dias apenas, um artigo de Peter Duesberg, professor em Berkeley, o mais célebre negador da relação HIV-SIDA. (Por pressão da comunidade científica, a Elsevier acabou por retirar o artigo do jornal.) O artigo refuta que o HIV tenha sido a causa de morte de milhares de sul-africanos durante a presidência de Mbecki e contesta o efeito dos anti-retrovirais na diminuição da mortalidade dos infectados. Acresce, para opacidade da situação, que o co-autor David Rasnick terá sido responsável por experiências ilegais com a finalidade aparente de promover vitaminas como tratamento alternativo aos ARV.

Em consequência, Duesberg é actualmente objecto de um inquérito da universidade à sua conduta científica. O caso vem descrito no AidsTruth e é interessante observar os negacionistas à defesa e ao ataque, como se vê na longa discussão que se segue ao artigo de Jon Cartwright no Times Higher Education, que publica também o depoimento de Bruce Charlton: a importância de divulgar ideias radicais.

quarta-feira, maio 5

Scajola II

O ministro Scajola demitiu-se ontem "em grande sofrimento" e elogado por Berlusconi. Enquanto continuam a chegar aos jornais notícias sobre o pagamento de 900 000 euros feito por um construtor para o apartamento de Scajola com vista para o Coliseu. Scajola afirma hoje no Corriere que não podia suspeitar que a casa teria sido paga por outros. Curiosa deixa. A novela está a tornar-se interessante.

Para compreender esta fala é preciso recordar que o ministro garante ter comprado a casita por 600 000 euros, parecendo não entender nada sobre o preço de um apartamento de luxo com 180 m2 no centro de Roma. Afinal parece admitir agora que uma parcela importante do preço terá sido paga por mão benemérita.

As notícias divulgadas nos últimos dias sobre o pagamento parecem bem fundadas, mas os advogados do construtor envolvido continuam a sustentar que não houve irregularidade.

Os jornais que apoiam o governo começam a tratar o assunto com pinças.

Se a nova lei sobre escutas proposta pelo ministro Alfano estivesse já em vigor ninguém teria sabido nada disto.

sábado, maio 1

Num jornal ou numa TV perto de si


Nas notícias italianas de hoje está em destaque o ministro Claudio Scajola. "Vou em frente e tenho a consciência tranquila". Tem também o apoio e a solidariedade do governo e do primeiro ministro, que lhe terá dito, vai trabalhar descansado que tudo isto é só uma bola de sabão. "Isto" agora é o falatório sobre suspeitas de favorecimento na compra de um apartamento para a filha, com vista para o Coliseu, uma coisa a caminho do milhão de euros. A polícia chegou lá através da investigação de outro caso. O homem, de resto, tem um currículo impressionante. O "episódio" que elejo como preferido é aquele em que convenceu a Alitalia a lançar um voo diário entre Roma e Albenga, sua cidade natal (o voo, que andou sempre de aviões vazios, fechou quase tão depressa como abriu). Os apoiantes incondicionais vêem em tudo isto uma manobra da "sinistra" e desafiam: mas mostrem lá as provas? Os mais prudentes acham que se deve aguardar pelas iniciativas da justiça.