domingo, maio 16

Da cinzenta literatura

Pachauri teve o seu primeiro encontro com a comissão de revisão do relatório do IPCC. Defendeu que não se pode deixar de ter em conta a literatura "cinzenta", criada fora do sistema convencional de validação científica.

Não sei se sim ou não. Engraçado, no entanto, vindo do responsável de uma vasta equipa que invocou o sistema de revisão pelos pares não só para fazer passar um ponto de vista cada vez mais desacreditado publicamente, como para silenciar e banir do sistema as vozes discordantes.

Mas isto não interessa nada. Simplesmente, levou-me de link em link a conhecer uma faceta de Pachauri que ignorava por completo: o homem dedica-se mesmo à literatura. Publicou no início deste ano o seu primeiro romance, Return to Almora, que as badanas podem descrever assim:

For Sanjay Nath, life is calling. Literally. Haunted by the remembrances of his previous life, spent at Almora, Sanjay starts to long and more to return to his ‘home land.’ The usual mundane progression of life fails to keep him busy, and moved by personal tragedies and futility of human life, he ultimately gives up everything to chase meaning, memories, and peace.

Parece pouco sumarento como resumo, mas procurando encontra-se melhor. O livro tem um cunho autobiográfico e conta a história de Sanjay, um homem com preocupações ambientais e que já em criança surpreendera os pais ao revelar que a sua esposa na encarnação anterior ainda era viva. Narra a entrada na universidade, a perda da virgindade, a "possessão por uma lascívia nunca antes sentida"; mais tarde, o encontro com Shirley MacLaine (a própria) e a atracção incontrolável pelas mamas das alunas na universidade. O Telegraph ofereceu alguns excertos da prosa:

Afterwards she held him close. ‘Sandy, I’ve learned something for the first time today. You are absolutely superb after meditation. Why don’t we make love every time immediately after you have meditated?’

Sanjay saw a shapely dark-skinned girl lying on Vinay’s bed. He was overcome by a lust that he had never known before … He removed his clothes and began to feel Sajni’s body, caressing her voluptuous breasts.


mas desgraçadamente...

the excitement got the better of him, before he could even get started.

He enjoyed the sensation of gently pushing Susan’s shoulders back a few inches, an action that served to lift her breasts even higher (...) He was excited by the sight of her heaving breasts, as she breathed in and out deeply.

Por acaso até consta que o lançamento do livro na Índia teve o patrocínio de grandes empresas a quem o TERI, instituto que Pachauri dirige, tem atribuído prémios e distinções, e também de um Banco que já em 2007 tinha apontado as alterações climáticas como uma das áreas-chave de investimento no futuro e que, compreensivelmente, tem subsidiado estudos de climatologia.

Como humilde espectador sem autoridade para avaliar a literatura sobre o clima, tenho de me limitar às minhas intuições para escolher os pontos de vista que julgo credíveis e formar o meu julgamento pessoal sobre o que se esconde por trás das deixas de quem fala. Também não faço crítica literária e muito menos a partir de meia dúzia de linhas, mas a impressão que fica é que não iria perder tempo a ler uma página sequer do livro. Claro que um cientista não tem que ser um bom escritor de romances, mas Pachauri acaba por sugerir, talvez sem dar conta, por intermédio da sua vida real, um enredo fascinante para um thriller: um bando de magnatas e especuladores aparecem a apoiar a novela de qualidade duvidosa de um escritor medíocre - o leitor não despegará do livro até saber porquê.

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