terça-feira, dezembro 27

O amor nos tempos de internet (3)

O encontro com a Margarida P. foi combinado para um domingo à tarde no átrio do Museu Gulbenkian. Já tinha recebido uma fotografia dela por e-mail e eu tinha retribuído, de modo que seria fácil reconhecer-nos. Quando a vi, percebi imediatamente porque é que na foto que me enviara aparecia quase de perfil: tinha uma borbulhagem extensa no lado esquerdo do rosto. Dermatite, explicou ela depois nervosamente, estava em tratamento. Engoli mentalmente em seco enguanto pronunciava o Olá, prazer da praxe. Mas fiquei logo a pensar que a foto devia ter alguns anos, pois a Margarida que estava na minha frente era razoavelmente diferente da Margarida de 35 anos que me tinha sido e-revelada.

Quer ver alguma exposição ou tomamos qualquer coisa? perguntei com delicadeza e formalidade. Margarida preferiu um passeio para tomar um sumo e partimos no meu carro para as docas. Em frente do rio fui assaltado por uma tristeza irreprimível: a memória dos momentos que ali passara com a Sofia e a crueza da humilhação que a vida parecia agora querer-me infligir fizeram-me sentir o mais desprezível dos homens. Já há tanto tempo que não vinha aqui, disse a Margarida entre muitas outras coisas que eu não ouvi. Estou separada há cinco anos e tenho saído muito pouco ultimamente. Falou-me da sua triste profissão (professora de história no ensino básico) e contou-me histórias da criançada enquanto ria muito. Contou-me também como quase ia caindo, inocentemente, no assédio de uma colega logo após a separação, até que um amigo gay lhe tinha aberto os olhos e lhe explicou que a outra era obviamente lésbica. Algumas das histórias até me podiam arrancar um sorriso noutras circunstâncias, mas se me dava vontade de alguma coisa era de chorar. Decorrida uma hora, eu sabia que este primeiro encontro com a Margarida era também o último. Ainda tenho que passar pela seguradora, disse. Até aos domingos me fazem trabalhar.

A minha cara deve ter-me denunciado o suficiente, porque Margarida despediu-se como quem sabia que o caso estava encerrado.

Com a Matilde as coisas foram diferentes logo de início, porque a distância obrigou a um período de muitos dias em que apenas contactámos por telefone. Comprei até um cartão de outro operador para poder falar com ela mais longamente sem me arruinar.

3 comentários:

Orlando disse...

Assinaste por baixo o postal de natal. Tem a havido uma discussão muito interessante sobre o tema, que parece estar longe de acabar. Vê lá se assumes as tuas responsabilidades e participas:))))

Escrevente disse...

ON: Quem assinou o postal foi o Lino, não eu. Talvez ele ainda não tenha tido tempo de participar na discussão.

Orlando disse...

Então tempo que falta. Quando é que vamos jantar com o Lino. Já não dá para dar a desculpa que moras no Porto.

PS: ando a precisar de fazer uns seguros. Precisava de umas opiniões.