sexta-feira, outubro 28

Realidades

Cheguei no domingo a uma pequena e agradável cidade espanhola para uma semana de trabalho. Aqui há vários filmes de língua espanhola em exibiçao: os americanos nao sao a maioria. Consultando as sinopses disponíveis, nenhuma me despertou grande interesse e resolvi ir ver o filme que nao tinha o resumo afixado - um filme argentino, produzido com o financiamento da tve: El aura. Nada de especial e um tanto pretensioso. Um sujeito envolve-se numa série de crimes praticamente sem motivaçao, como movido por piloto automático. O cinema, comercial ou nem por isso, está pela hora da morte. Já tudo foi contado e filmado. As boas surpresas sao raras.

Nos dias seguintes confirmei que, como de costume, a realidade se encarrega de nos evitar o tédio, pois está mais interessante que as ficçoes. Há debate político forte na imprensa e na rádio, por aqui. A COPE, uma rádio ligada à Igreja, ataca o PSOE 24 horas sobre 24 e motivos nao lhe faltam: o estatuto da Catalunha e um projecto de lei da ministra da vivienda, que inclui o objectivo de expropriar andares desocupados, têm servido de mote para os media de oposiçao. O PSOE responde com a mesma violência, atacando o PP e a COPE em especial. Na COPE há momentos de tele-evangelismo primário, o que nao quer dizer que as críticas nao tenham razao de ser. Nao temos nada do género em Portugal. (Exemplo: um relato de fútbol é cortado por jingles como "nos quieren quitar la constituicion!") Tambem foi muito criticada a intençao de Zapatero de participar na apresentacao, hoje, de uma fundaçao para a aliança das civilizaçoes, em companhia pouco recomendável: Tarik Ramadan, um islamista proibido de entrar nos EEUU e vigiado pela polícia francesa (mas, curiosamente, escolhido recentemente por Blair para o aconselhamento sobre como tratar com os jovens de origem islâmica na GB). Zapatero cancelou a sua participaçao. A fundaçao é impulsionada por Masud Zandi, milionário hispano-iraniano que enriqueceu vendendo cadeiras de rodas aos estropiados da guerra Irao-Iraque e conseguiu "surfar" incólume na crista de um recente escândalo financeiro (Gescartera).

A ficçao está, por isso, despedida com justa causa. Com esta realidade, quem precisa dela?

1 comentário:

Nino disse...

O tempo encarregou-se de dar razão aos movimentos conservadores que, malgrado as suas contradições, desconfiavam da panaceia da esquerda universalista, afinal cáustica.