E os homosexuais? E os ciganos? E os escravos africanos? E os bruxos e bruxas? E os ateus? Os días e as horas de muitos anos não bastariam ao Estado espanhol para por-se de joelhos e pedir perdão a Deus e aos vivos por todas as injustiças cometidas por quem governou ao longo da sua antiquíssima história contra colectividades ou indivíduos diversos. E o certo é que ninguém ficaria satisfeito com o que, para mais, não passaría de uma pantomima desprovida de conteúdo e seriedade.
A propósito de uma iniciativa legislativa do PSOE no sentido de desagravar os descendentes de muçulmanos expulsos de Espanha no início do século 17, Mario Vargas Llosa recorda, no El País de hoje, porque não se deve misturar a memória com a história e porque seria bom que os políticos não usurpassem a função dos historiadores.
Foi menos [brutal] a expulsão dos judeus de Espanha en 1492? Estavam há tantos ou mais séculos na Península que [os mouros] e a sua saída forçada, decidida por razões políticas e religiosas pelos Reis Católicos, acumulou todos os agravantes possíveis.
Há momentos dignos de censura na história de todos os povos, mas não parece adequado apagá-los por decreto. O poder político olha a história do ponto de vista das suas conveniências circunstanciais. No caso concreto, o PSOE está apenas deslumbrado com a descoberta de que os imigrantes dão votos. Mas a luta política pode não ser boa conselheira para o efeito de explicar a história.
domingo, novembro 29
domingo, novembro 22
Histórias de encantar
Porque gostamos de ler ou de que nos contem histórias? Talvez, como diz Vargas Llosa, porque "queremos viver outra vida diferente da que nos calhou". Com todas as histórias já mais que contadas, recontadas e requentadas, é um prazer redescobrir a arte e o engenho de inventar os enredos que são, na sua essência, os que não deixaram de ser reproduzidos e de nos apaixonar ao longo de séculos.
Os Contos e Novelas de Marguerite de Navarre são uma joia da literatura no seu sentido mais puro e autêntico: o texto é encantatório e as histórias absorventes, a ponto de nos afligir a aproximação do fim. O que vale é que são muitas, espécie de mil-e-uma-noites em que a Scherazade se chama Parlemente e debita os contos sem ter a cabeça em jogo.
Os episódios são numerados e cada título é uma pequena sinopse do enredo, como:
XXXVI. Um presidente de Grenoble, alertado para as prevaricações da sua mulher, actuou tão sabiamente que delas se vingou sem que a sua honra fosse atingida em público.
XLVI. De um frade que dizia que o marido cometia um grande crime ao bater na mulher.
LIX. Um fidalgo é surpreendido pela mulher quando julgava estar a beijar uma das criadas.
LXVIII. Uma mulher dá de comer ao marido pó de cantáridas para dele receber amor e pensou que ele rebentava.
LXX. Horrível impudicícia de uma duquesa foi a causa da sua morte. e da de duas outras pessoas que se amavam na perfeição.
Na Septuagésima Novela, a duquesa de Borgonha, cuja beleza satisfazia o marido de tal maneira que ele "não cuidava senão de a ter contente", é acometida de uma louca paixão por um jovem servidor do duque. Depois de tentar seduzi-lo sem êxito, vinga-se acusando-o ao marido de assédio. O duque, que tinha grande estima pelo jovem, recusa-se a acreditar. A mulher convence-o, fazendo notar que ao rapaz não se conhecia namorada. O duque quer então saber mais, e o jovem acaba por lhe confessar, implorando segredo, que é amante da senhora de Vergy, sobrinha do seu amo e viúva, que não podia aspirar ter por esposa. Para provar que não mente, o rapaz conduz o duque até ao sítio onde se encontra com a namorada. O sinal de que o caminho estava livre era dado pelo latir de um cãozinho que ela deixava no jardim. O duque fica satisfeito e regressa tranquilo a casa, dizendo à mulher que afinal o rapaz tem um compromisso. A duquesa, ferida no seu amor não correspondido, quer saber com quem; estando grávida, ameaça perder a criança se o marido não lhe contar a verdade, e este cede. Dias depois há festa no palácio e a duquesa aproxima-se da senhora de Vergy, a quem pergunta com o coração trespassado de ciume:
"E tu, bela sobrinha, como é possível que a tua beleza permaneça sem amigo ou servidor?"
"Senhora, respondeeu-lhe a rapariga, a minha beleza nada me trouxe depois da morte do meu marido porque nenhum outro homem eu quis para além dos filhos que me deixou, com os quais vivo feliz."
"Linda sobrinha, linda sobrinha, respondeu-lhe a duquesa com execrável desdém, não há amor secreto que não venha à luz, nem cãozinho bem tratado de que não se escutem os latidos."
Depois é tudo rápido: a senhora de Vergy sente-se traída, imaginando que o segredo só poderia ter transpirado para outra amante do rapaz, e morre de amor ferido depois de um monólogo de duas páginas e meia onde descreve o detalhe da sua dor excruciante. O rapaz vai procurá-la e uma aia que assistira à cena reproduz-lhe as palavras da moribunda; o jovem não suporta a culpa e trespassa o coração com a espada depois de outro monólogo de duas páginas. O duque, posto ao corrente dos factos, percebendo que a tragédia fora causada pela perfídia da mulher, acaba por degolá-la e mandar construir uma abadia para se remir do pecado. Depois "empreendeu uma viagem contra os Turcos, em que Deus o favoreceu tanto que de lá trouxe honra e proveito, tendo recolhido à abadia onde estavam sepultados a mulher e os dois amantes, lá tendo passado a velhice em paz com Deus".
As personagens não têm nomes mas são incrivelmente próximas de nós. A diferença é que quando dizem que vão morrer de amor morrem de facto, não sem antes declamarem em sofisticada prosa as razões da sua angústia e de o mundo se lhes ter tornado um lugar inabitável.
Mentiras convenientes?
Se a autencidade dos documentos for confirmada (e parece que tudo aponta para aí) poderemos estar diante de de um escândalo monumental - o maior da ciência moderna, pensam alguns. O facto começou a ser comentado na internet há dois dias atrás e dele não param de surgir reproduções sucessivas.
Um hacker terá entrado nos computadores do Centro de Investigação do Clima da Universidade de West Anglia e colocou na net muitos mega de e-mails e ficheiros confidenciais onde, ao que parece, há documentação suficiente para provar que o "aquecimento global antropogénico" é um embuste antropogénico. Os ficheiros incluem:
-prova de que houve manipulação intencional de dados para obter resultados pré-determinados;
-comentários em privado onde perpassam dúvidas de que a Terra esteja em fase de aquecimento;
-conversa sobre supressão de provas inconvenientes;
-discussão sobre como silenciar os cientistas discordantes, através do seu afastamento do processo de revisão pelos pares e da descredibilização de certas revistas científicas.
Poderemos estar diante de de um escândalo monumental, escrevi acima, mas seria mais correcto escrever "poderíamos". Mesmo que tudo, ou boa parte, seja confirmado, as ideias feitas não morrem de um dia para o outro, principalmente se dão proveito económico e ideológico a muita gente. No limite, poderemos estar diante de uma conspiração sinistra para extrair dinheiro aos estados através das taxas de poluição. Mas quem se importará, se a ideia é simpática e de alta rendibilidade? Também depois do escândalo Sokal, em 1996, a "literatura académica" continuou a produzir discursos demenciais em áreas como a educação e certas ciências sociais. E nem depois da queda do muro foram seriamente abaladas as simpatias por um sistema político que, para além de não resolver os problemas dos povos, causou escravização, degradação e mortes aos milhões. Que efeito sensível podem, então, ter revelações cuja comprovação só pode ser feita no recato de gabinetes e laboratórios, confrontando dados e procedimentos cuja manipulação exige especialização técnica?
Um hacker terá entrado nos computadores do Centro de Investigação do Clima da Universidade de West Anglia e colocou na net muitos mega de e-mails e ficheiros confidenciais onde, ao que parece, há documentação suficiente para provar que o "aquecimento global antropogénico" é um embuste antropogénico. Os ficheiros incluem:
-prova de que houve manipulação intencional de dados para obter resultados pré-determinados;
-comentários em privado onde perpassam dúvidas de que a Terra esteja em fase de aquecimento;
-conversa sobre supressão de provas inconvenientes;
-discussão sobre como silenciar os cientistas discordantes, através do seu afastamento do processo de revisão pelos pares e da descredibilização de certas revistas científicas.
Poderemos estar diante de de um escândalo monumental, escrevi acima, mas seria mais correcto escrever "poderíamos". Mesmo que tudo, ou boa parte, seja confirmado, as ideias feitas não morrem de um dia para o outro, principalmente se dão proveito económico e ideológico a muita gente. No limite, poderemos estar diante de uma conspiração sinistra para extrair dinheiro aos estados através das taxas de poluição. Mas quem se importará, se a ideia é simpática e de alta rendibilidade? Também depois do escândalo Sokal, em 1996, a "literatura académica" continuou a produzir discursos demenciais em áreas como a educação e certas ciências sociais. E nem depois da queda do muro foram seriamente abaladas as simpatias por um sistema político que, para além de não resolver os problemas dos povos, causou escravização, degradação e mortes aos milhões. Que efeito sensível podem, então, ter revelações cuja comprovação só pode ser feita no recato de gabinetes e laboratórios, confrontando dados e procedimentos cuja manipulação exige especialização técnica?
sexta-feira, novembro 13
O prazer nas tuas mãos
O conselho da Juventude do governo da Extremadura acaba de lançar a campanha "O prazer nas tuas mãos" dirigida a jovens dos 14 aos 17 anos. Os objectivos confessados são:
"construir espaços de intercâmbio e participacão onde sejam abordadas as preocupacões e as angústias dos jovens sobre a sexualidade" e "facilitar a aquisisição, desenvolvimento e interiorização de hábitos saudáveis, autoestima, segurança e pôr em prática através da autoexploracão sexual e do autoconhecimento erótico do ponto de vista de uma perspectiva feminista..." bláblá. Nada muito diferente, na forma da redacção, dos objectivos de disciplinas convencionais do currículo do ensino básico emanados dessas entidades assombrosas que são os ministérios da educação. Só que aqui o programa vai mais longe, dele fazendo parte carícias, masturbação e utilização de brinquedos como as bolas chinesas. Os jornais dizem que a campanha custou 14000€ e foi encomendada à loja madrilenha Los Placeres de Lola.
Há aqui várias coisas estranhas. Primeiro, acho a campanha muito barata, o que sugere o uso de bolas de má qualidade. Segundo, deve ter havido um erro de casting monumental na escolha do público-alvo: tenho a certeza que muitos adultos acima dos 50 teriam muito mais a aprender nestas aulas do que os xavalos e xavalas nos 14-17. Finalmente, com tanta preocupação de igualdade de género e focalização no ponto de vista feminista, é imperdoável que o título da campanha mencione a mão e omita o dedo. Ah, o discurso machista insinua-se por onde menos se espera.
"construir espaços de intercâmbio e participacão onde sejam abordadas as preocupacões e as angústias dos jovens sobre a sexualidade" e "facilitar a aquisisição, desenvolvimento e interiorização de hábitos saudáveis, autoestima, segurança e pôr em prática através da autoexploracão sexual e do autoconhecimento erótico do ponto de vista de uma perspectiva feminista..." bláblá. Nada muito diferente, na forma da redacção, dos objectivos de disciplinas convencionais do currículo do ensino básico emanados dessas entidades assombrosas que são os ministérios da educação. Só que aqui o programa vai mais longe, dele fazendo parte carícias, masturbação e utilização de brinquedos como as bolas chinesas. Os jornais dizem que a campanha custou 14000€ e foi encomendada à loja madrilenha Los Placeres de Lola.
Há aqui várias coisas estranhas. Primeiro, acho a campanha muito barata, o que sugere o uso de bolas de má qualidade. Segundo, deve ter havido um erro de casting monumental na escolha do público-alvo: tenho a certeza que muitos adultos acima dos 50 teriam muito mais a aprender nestas aulas do que os xavalos e xavalas nos 14-17. Finalmente, com tanta preocupação de igualdade de género e focalização no ponto de vista feminista, é imperdoável que o título da campanha mencione a mão e omita o dedo. Ah, o discurso machista insinua-se por onde menos se espera.
quarta-feira, novembro 11
O fabuloso destino de Suha
Espectador à beira do adormecimento com o enrolar da novela sobre a corrupção caseira, não posso deixar de lamentar a pobreza do enredo. Também, que se pode esperar de um tema que chafurda em sucata? Nem dá para argumento de um filme sem subsídios. De resto, como tudo se reduz a casos tratados pelo telefone, bastaria fazer um folhetim radiofónico ou um filme só com banda sonora como a Branca de Neve. Infelizmente, ambos os formatos parecem fora de moda, um por ser muito atrás e outro demasiado à frente para os gostos contemporâneos.
Então, até porque hoje é aniversário da defunção do seu saudoso (haha) marido, dei por mim a lembrar-me de uma senhora com uma história bem mais engraçada. Segunda e última esposa daquele homem que lançou a moda dos lenços aos quadrados e também foi o chefe da resistência palestiniana que boicotou o acordo de Camp David, Suha Arafat já vivia em Paris quando o esposo lá passou os últimos dias. No papel de cônjugue pode controlar o acesso às cenas dos últimos momentos, após as quais ficaram no ar teorias conspirativas segundo as quais o líder teria morrido por envenamento ou SIDA (ambas as alternativas gozam de bastante popularidade). A sua conta bancária engordou consideravelmente com as transferências provenientes das ajudas internacionais à causa palestiniana, digo, à Autoridade Palestiniana. Investiu em hotelaria em Tunes e, após a passagem do marido por este planeta, não contente com o que já amealhara, exigiu à AP uma pensão vitalícia. A AP concordou em fazer-lhe um pagamento fixo de 20 milhões de dólares e uma pensão mensal de 500 000, coisa que ela parece ter recusado, por saber que a fortuna da PA se mede com mais uns zeros (ah, a pobreza que gera o terrorismo).
Suha volta então à Tunísia e, experiente como é a escolher a cama onde se deita, procura a provavelmente mais corrupta família do país para voltar a casar. E fá-lo com Bel Hassan Trabelsi, cunhado do presidente, aliando-se à sua irmã Leila Trabelsi para os grandes investimentos imobiliários. As coisas não lhe correram tão bem como esperava: Bel Hassan era casado e a lei tunisina não permite a poligamia.
A partir de então, também a amizade com a ex-futura-cunhada se estraga e começam as acusações, sem dúvida merecidas, porque, ao pé de Leila, Suha é menina de coro. Teve graça, por exemplo, o episódio em que Leila manda fechar um liceu privado para abrir um outro de que ela e Suha teriam a propriedade, mas logo que Suha entra com a sua quota (2,5 milhões de euro), Leila rói o cordel. As desavenças entre as duas têm como subproduto o levantar do véu sobre uma mão cheia de aldrabices que envolvem quantias com muitos zeros.
Acaba expulsa do país, tendo o ex-futuro-novo-marido ficado na posse dos seus bens. Um dos últimos escândalos com a pegada de Suha relaciona-se com mais um grande empreendimento imobiliário de que resultou o favorecimento de um genro do presidente tunisino e motivou inquietação no próprio partido do poder.
Actualmente Suha vive em Malta, numa casita que, diz-se, lhe foi oferecida pelo coronel Kadhafi, tendo-lhe sido retirada a nacionalidade tunisina (que lhe tinha sido atribuída por decreto) na sequência das trapalhadas com a família presidencial.
Então, até porque hoje é aniversário da defunção do seu saudoso (haha) marido, dei por mim a lembrar-me de uma senhora com uma história bem mais engraçada. Segunda e última esposa daquele homem que lançou a moda dos lenços aos quadrados e também foi o chefe da resistência palestiniana que boicotou o acordo de Camp David, Suha Arafat já vivia em Paris quando o esposo lá passou os últimos dias. No papel de cônjugue pode controlar o acesso às cenas dos últimos momentos, após as quais ficaram no ar teorias conspirativas segundo as quais o líder teria morrido por envenamento ou SIDA (ambas as alternativas gozam de bastante popularidade). A sua conta bancária engordou consideravelmente com as transferências provenientes das ajudas internacionais à causa palestiniana, digo, à Autoridade Palestiniana. Investiu em hotelaria em Tunes e, após a passagem do marido por este planeta, não contente com o que já amealhara, exigiu à AP uma pensão vitalícia. A AP concordou em fazer-lhe um pagamento fixo de 20 milhões de dólares e uma pensão mensal de 500 000, coisa que ela parece ter recusado, por saber que a fortuna da PA se mede com mais uns zeros (ah, a pobreza que gera o terrorismo).
Suha volta então à Tunísia e, experiente como é a escolher a cama onde se deita, procura a provavelmente mais corrupta família do país para voltar a casar. E fá-lo com Bel Hassan Trabelsi, cunhado do presidente, aliando-se à sua irmã Leila Trabelsi para os grandes investimentos imobiliários. As coisas não lhe correram tão bem como esperava: Bel Hassan era casado e a lei tunisina não permite a poligamia.
A partir de então, também a amizade com a ex-futura-cunhada se estraga e começam as acusações, sem dúvida merecidas, porque, ao pé de Leila, Suha é menina de coro. Teve graça, por exemplo, o episódio em que Leila manda fechar um liceu privado para abrir um outro de que ela e Suha teriam a propriedade, mas logo que Suha entra com a sua quota (2,5 milhões de euro), Leila rói o cordel. As desavenças entre as duas têm como subproduto o levantar do véu sobre uma mão cheia de aldrabices que envolvem quantias com muitos zeros.
Acaba expulsa do país, tendo o ex-futuro-novo-marido ficado na posse dos seus bens. Um dos últimos escândalos com a pegada de Suha relaciona-se com mais um grande empreendimento imobiliário de que resultou o favorecimento de um genro do presidente tunisino e motivou inquietação no próprio partido do poder.
Actualmente Suha vive em Malta, numa casita que, diz-se, lhe foi oferecida pelo coronel Kadhafi, tendo-lhe sido retirada a nacionalidade tunisina (que lhe tinha sido atribuída por decreto) na sequência das trapalhadas com a família presidencial.
segunda-feira, novembro 9
Apenas 1 em 20
Segundo um recente inquérito, apenas uma de cada vinte crianças britânicas pensa que Hitler foi um treinador de futebol. Quase 80% acham que ele era chefe do partido Nazi e apenas 13% o apontam como tendo descoberto a gravidade no século 17.
É caso para estarmos optimistas. Em contrapartida, os peritos da educação que inundam os gabinetes ministeriais europeus devem levar as mãos à cabeça. Apesar dos tratos de polé que têm infligido ao ensino-aprendizagem (haha), a taxa de penetração de ensinamentos errados é relativamente modesta. Urge inflectir e passar rapidamente à proibição formal de que nas escolas se ensine o que quer que seja (o que até aqui é apenas insinuado sob ameaças veladas).
É caso para estarmos optimistas. Em contrapartida, os peritos da educação que inundam os gabinetes ministeriais europeus devem levar as mãos à cabeça. Apesar dos tratos de polé que têm infligido ao ensino-aprendizagem (haha), a taxa de penetração de ensinamentos errados é relativamente modesta. Urge inflectir e passar rapidamente à proibição formal de que nas escolas se ensine o que quer que seja (o que até aqui é apenas insinuado sob ameaças veladas).
Perestroika?
Para lá dos festivos dominós que assinalarão a queda do Muro, sondagens que denunciam moderação no entusiasmo com a mudança, e avisos sobre o estado da arte no capitalismo vêm lembrar-nos que a complexidade do mundo real está muito para além das representações simplistas com que julgamos compreendê-lo nos momentos de euforia.
Algum desencanto com a democracia e a economia de mercado tem as justificações que conhecemos, e todas as frases que sobre isso se escrevam vão desembocar à palavra "crise". Mas não deixa de apetecer parodiar os que sempre pensaram que o sistema de Leste ruiu porque aquela inominável coisa não era socialismo. E esta inominável coisa que etiquetam de neo-liberalismo selvagem, é mesmo capitalismo com mercado a funcionar livremente?
É irónico que Gorbachov reclame a urgência da nossa perestroika. Sem dúvida que está a pensar em Obama (curiosamente, são eles os dois presidentes em exercício que foram Nobelizados). Por muito que devamos a Gorbachov, o seu apelo é pouco apropriado para levar a sério: na medida em que Gorbachov perdera a vontade de dar cobertura ao sistema a que presidia, a comparação pode ser entendida como um recado a Obama para que desista dos Estados Unidos. Não é fácil indicar uma causa única para a queda do Muro, mas parece evidente que sem a falta de vontade de o defender a história que conhecemos teria tido um outro desfecho.
Algum desencanto com a democracia e a economia de mercado tem as justificações que conhecemos, e todas as frases que sobre isso se escrevam vão desembocar à palavra "crise". Mas não deixa de apetecer parodiar os que sempre pensaram que o sistema de Leste ruiu porque aquela inominável coisa não era socialismo. E esta inominável coisa que etiquetam de neo-liberalismo selvagem, é mesmo capitalismo com mercado a funcionar livremente?
É irónico que Gorbachov reclame a urgência da nossa perestroika. Sem dúvida que está a pensar em Obama (curiosamente, são eles os dois presidentes em exercício que foram Nobelizados). Por muito que devamos a Gorbachov, o seu apelo é pouco apropriado para levar a sério: na medida em que Gorbachov perdera a vontade de dar cobertura ao sistema a que presidia, a comparação pode ser entendida como um recado a Obama para que desista dos Estados Unidos. Não é fácil indicar uma causa única para a queda do Muro, mas parece evidente que sem a falta de vontade de o defender a história que conhecemos teria tido um outro desfecho.
domingo, novembro 8
Crimes e castigos
Um homem de 33 anos, condenado por adultério, foi executado por apedrejamento na cidade de Merka, perto da capital da Somália, conta a BBC. A amante, grávida, será executada pelo mesmo processo logo que dê à luz a criança produto do crime.
Columbine versão jihad
Nas primeiras notícias, Nidal Malik Hasan era um psiquiatra, descendente de palestinianos, a quem o stress levou ao acto homicida desesperado de que resultaram treze mortos.
O caso passa-se em Fort Hood, zona livre de armas, onde os regulamentos impedem os militares de andar armados em circunstâncias normais, como é o caso de fazer fila para uma vacina.
Mas sabemos agora que Hasan evidenciava já há tempo comportamentos que no mínimo deveriam ter dado lugar a algumas precauções. Era conhecido o seu repúdio pelas intervenções dos Estados Unidos no Iraque e no Afeganistão e preparavam-se para enviá-lo para o Afeganistão. O problema não é ser muçulmano (será?), é existirem razões que deveriam ter motivado alguma prevenção. Colegas de profissão recordam uma bizarra conferência de Hasan durante a qual ele referiu o ensinamento do Corão sobre como proceder com as cabeças dos infiéis: degolar e lançar ao fogo.
Por muito que se tente disfarçar, há nesta história negligências que parecem óbvias. Como pode uma pessoa assim ser mantida a prestar serviço numa unidade militar? Haverá muita explicação para os assassinatos com base no bláblá psiquiátrico. Mas o facto de se tratar de um muçulmano devoto dificilmente será assumido ou apontado como provável causa da tragédia. As razões também são óbvias: logo viriam as acusações de islamofobia ou racismo que ninguém hoje em dia aguenta. Infelizmente, os muitos actos terroristas levados a cabo por muçulmanos radicais aconselhariam a colocar a hipótese, nem que fosse por mera curiosidade científica. Além de que ninguém se livra de uma fatwa de algum louco que se sinta ofendido por ver classificar a devoção ao Islão como anomalia psíquica.
O caso passa-se em Fort Hood, zona livre de armas, onde os regulamentos impedem os militares de andar armados em circunstâncias normais, como é o caso de fazer fila para uma vacina.
Mas sabemos agora que Hasan evidenciava já há tempo comportamentos que no mínimo deveriam ter dado lugar a algumas precauções. Era conhecido o seu repúdio pelas intervenções dos Estados Unidos no Iraque e no Afeganistão e preparavam-se para enviá-lo para o Afeganistão. O problema não é ser muçulmano (será?), é existirem razões que deveriam ter motivado alguma prevenção. Colegas de profissão recordam uma bizarra conferência de Hasan durante a qual ele referiu o ensinamento do Corão sobre como proceder com as cabeças dos infiéis: degolar e lançar ao fogo.
Por muito que se tente disfarçar, há nesta história negligências que parecem óbvias. Como pode uma pessoa assim ser mantida a prestar serviço numa unidade militar? Haverá muita explicação para os assassinatos com base no bláblá psiquiátrico. Mas o facto de se tratar de um muçulmano devoto dificilmente será assumido ou apontado como provável causa da tragédia. As razões também são óbvias: logo viriam as acusações de islamofobia ou racismo que ninguém hoje em dia aguenta. Infelizmente, os muitos actos terroristas levados a cabo por muçulmanos radicais aconselhariam a colocar a hipótese, nem que fosse por mera curiosidade científica. Além de que ninguém se livra de uma fatwa de algum louco que se sinta ofendido por ver classificar a devoção ao Islão como anomalia psíquica.
quinta-feira, novembro 5
Minority Report, Cuba 2009
As UMAP já foram encerradas há muito tempo, mas...
Castell Medina, 19 anos, o companheiro Damián Arancibia Touriño, de 21, costureiros sem autorização estatal;
Eliseo Montalvo, 25 anos, sem trabalho estável e tendo "relações com estrangeiros";
e outros três jovens homossexuais,
foram há uma semana condenados pelo Tribunal Provincial de Boyeros (perto de La Habana) a penas entre 2 e 3 anos de prisão por propensão a delinquir no futuro, aplicando a chamada Lei de Perigosidade Preditiva.
Castell Medina, 19 anos, o companheiro Damián Arancibia Touriño, de 21, costureiros sem autorização estatal;
Eliseo Montalvo, 25 anos, sem trabalho estável e tendo "relações com estrangeiros";
e outros três jovens homossexuais,
foram há uma semana condenados pelo Tribunal Provincial de Boyeros (perto de La Habana) a penas entre 2 e 3 anos de prisão por propensão a delinquir no futuro, aplicando a chamada Lei de Perigosidade Preditiva.
segunda-feira, novembro 2
Golpes e pressões
Sob pressão dos Estados Unidos, o proto-golpista Zelaya assinou na 6ª feira o acordo para a saída da crise política nas Honduras: a "restituição" ficaria nas mãos do Congresso. Ainda mal o mundo descansava ao ver a resolução do problema entregue aos hondurenhos através de compromisso escrito, vêm os porta-vozes de Zelaya ontem, sem surpresas, anunciar que o acordo só será válido se o Congresso decidir a favor do homem que foi empurrado em pijama.
Zelaya já vale pouco neste momento. Será que o próprio Chávez aposta nele? A "legítima ministra dos negócios estrangeiros", Patricia Rodas, seria para o socialismo do Século XXI uma candidata bem mais apetecível. Em Zelaya está difícil confiar e os negociadores dos Estados Unidos sabem bem disso. Para que o homem mantivesse a sua posição durante mais de dois dias seguidos lá teria de estar sempre o diplomata a dizer-lhe ó pah, se te desdizes mando a bófia atrás do Héctor, agora vê lá. Thomas Shannon tem mais que fazer.
Zelaya já vale pouco neste momento. Será que o próprio Chávez aposta nele? A "legítima ministra dos negócios estrangeiros", Patricia Rodas, seria para o socialismo do Século XXI uma candidata bem mais apetecível. Em Zelaya está difícil confiar e os negociadores dos Estados Unidos sabem bem disso. Para que o homem mantivesse a sua posição durante mais de dois dias seguidos lá teria de estar sempre o diplomata a dizer-lhe ó pah, se te desdizes mando a bófia atrás do Héctor, agora vê lá. Thomas Shannon tem mais que fazer.
domingo, novembro 1
Mario Vargas Llosa sobre o declínio do erotismo
Também no El País de hoje, e a propósito da exposição do Museu Thyssen e Caja Madrid, Vargas Llosa discorre sobre o lado bom e o lado mau da vulgarização do erotismo. Passa em revista a inspiração fornecida pela antiguidade pagã e também pelo cristianismo, que proporcionou a grandes artistas o ensejo de nos darem a contemplar inúmeras Evas, Madonas, Cristos, São Sebastiões e mais todos os santos e santas do calendário, desafiante exibição do corpo que a censura eclesiástica não pôde deixar de tolerar.
Com o desaparecimento dos bloqueios censórios, o erotismo banaliza-se, e com ele a arte que inspira. Llosa convoca o Endimião Adormecido de Canova para o opor à frivolidade do video David (de um autor de que provavelmente não valerá a pena reter o nome), que voyeuriza o sono de Beckham.
Mas somos, provavelmente mais felizes do que antes. Menos censura é também menos constrangimento e menos discriminação. A arte ficou a perder? "Fazer amor já não é uma arte, é um desporto sem risco, como correr no tapete do ginásio"? Paciência. Não se pode ter tudo.
O estudante de Matemática e o Ayatollah
Na passada quarta feira, um estudante do 2º ano de Matemática da Universidade de Sharif, identificado como Mahoud Vahidnia, foi figura central num encontro com o lider Supremo, a quem questionou durante 20 minutos sobre a falta de liberdade de expressão e a estrutura do poder no país. Hoje, o Corriere della Sera escreve que Mahoud está preso. As notícias são pouco precisas e nalguns sítios discute-se se o episódio foi encenado pelo regime.
Heimatlos, os mundos desaparecidos
Considero-me apátrida. A minha pátria desapareceu, a RDA. Não considero a RFA a minha pátria. A minha pátria hoje é a minha família próxima, são os meus amigos.
Palavras de Werner Grossmann, último chefe da Stasi, à Radio France Internationale. Uma das suas últimas missões foi, em colaboração com o KGB, tratar do exílio pacífico do casal Honecker no Chile. Depois da expulsão de Honecker do partido, ter-lhe-á aconselhado uma de quatro opções: Coreia do Norte, Cuba, Palestina ou Chile. Em Moscovo ninguém garantiria a segurança do ex-presidente, a Coreia do Norte não era de fiar e tanto Cuba como a Palestina não ofereciam garantias.
Palavras de Werner Grossmann, último chefe da Stasi, à Radio France Internationale. Uma das suas últimas missões foi, em colaboração com o KGB, tratar do exílio pacífico do casal Honecker no Chile. Depois da expulsão de Honecker do partido, ter-lhe-á aconselhado uma de quatro opções: Coreia do Norte, Cuba, Palestina ou Chile. Em Moscovo ninguém garantiria a segurança do ex-presidente, a Coreia do Norte não era de fiar e tanto Cuba como a Palestina não ofereciam garantias.
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