domingo, outubro 5

Burocratas queixam-se de burocracia

A FNE ataca o estatuto da carreira docente por prever uma prova de acesso à profissão e por dividir os professores em duas categorias. Para os dirigentes da FNE tudo isto é inútil e incompreensível. Queixam-se também do excesso de burocracia e papelada e das reuniões inúteis que o processo de avaliação envolve. Em face do modelo de avaliação imposto, estão cheios de razão neste ponto. Mas esquecem que a visão idílica de que todos os professores (e, já agora, todos os alunos) valem o mesmo foi longamente instilada em décadas de doutrinação burocrática de que sindicatos ou associações de professores nunca se demarcaram, antes nela colaborando.* Na verdade, para que outra coisa serviu o cinzentismo do eduquês senão para menorizar a importância dos conteúdos e disfarçar a existência de diferentes níveis de qualidade? Foi para isso que "especialistas" transformaram o ensino numa monstruosidade burocrática apoiada num linguajar pseudo-técnico, roubado à vulgata da psicologia e da gestão de empresas. Durante muitos anos ninguém se riu dessa linguagem ou das exóticas grelhas com ela construídas, antes a adoptaram como sua. O feitiço vira-se contra o feiticeiro quando os que durante anos e anos se especializaram nos relatórios feitos a copy-paste com o bem conhecido palavreado do ensino-aprendizagem, das atitudes e das competências (por vezes promovidos a dissertações de mestrado ou doutoramento!) vêem o mesmo arsenal a cair-lhes em cima sob a forma de tortura avaliativa.

*Exemplo: entre outras preciosidades, podemos encontrar no site da FNE o anúncio de um curso de verão em 2008 que propõe (per)cursos de debate e análise de algumas problemáticas relevantes no campo da educação e em particular, no que respeita à avaliação, tem como objectivos

* Identificar e caracterizar diferentes concepções e modelos de avaliação institucional;
* Distinguir distintas “lógicas e racionalidades” subsumidas nos diferentes dispositivos de avaliação institucional;
* Capacitar para a produção e utilização mais informada de dispositivos de (auto) avaliação institucional;
* Desenvolver um espírito crítico e reflexivo em torno das várias agendas e agentes da avaliação institucional.


Fascinante, não? Fica-se a lamentar não se ter podido assistir.

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