A internet não é só uma ferramenta. É um utensílio que passa a ser prolongamento do nosso próprio corpo, do nosso próprio cérebro, o qual se vai também, de modo discreto, adaptando pouco a pouco a esse novo sistema de informar-se e de pensar, renunciando pouco a pouco às funções que esse sistema faz por ele e, por vezes, melhor que ele.
Mário Vargas Llosa discorre, em artigo no EL PAÍS, sobre os efeitos da internet nos hábitos de leitura e procura de informação. Há perguntas que ficarão muito tempo sem resposta. Quem vai dar-se ao trabalho de ler um livro de ponta a ponta, podendo encontrar na net resumos e comentários, provavelmente com qualidade? O número de horas a consumir com o Crime e Castigo (digamos) não é coisa negligenciável em presença de uma agenda preenchida. Que cavernícola vai sobrecarregar a memória com dados que a coreografia do teclado e do rato torna acessíveis em segundos? Para quê encher estantes com a sabedoria dos mestres e a erudição dos clássicos? O Google sabe mais.
Na verdade, possivelmente lemos mais agora, mas de forma mais fragmentada. A própria internet concorre consigo mesma. Como o tempo escasseia para ler todos os artigos que nos parecem interessantes, percorremo-los em diagonal e vamos em directo aos comentários, onde encontramos uma pré-avaliação do interesse do conteúdo, justificando ou não uma atenção mais demorada. Isto vale tanto para artigos de jornais e magazines online como para blogs. E até para coisas-tipo-facebook, embora nestas a dimensão do texto já esteja limitada pela formatação do sítio. Será o facebook a perspectiva mais aterradora do fim da leitura? Iremos acabar por consumir apenas a "boca" breve, comprimida, zipada, que é suportável pelo cérebro interneticamente modificado do leitor moderno?
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