domingo, setembro 11

Memória de Nova Orleães: os ricos


Mansão no estilo gótico-vitoriano do Garden District de Nova Orleães. Já não é verão, mas ainda não é outono. Jardim fantástico ao fundo, com floresta tropical, do período dos fetos gigantes.



SRA. VENABLE: O meu filho andava à procura de Deus, ou melhor: de uma imagem clara e nítida de Deus. No dia que lhe contei, um dia escaldante – o doutor conhece o sol do equador? – ele deixou-se ficar todo o dia no cesto da gávea a contemplar a praia. Só desceu quando estava escuro demais para ver. Já cá em baixo, disse-me: “Mãe, desta vez vi-o!” Depois teve febres e delirava com o que tinha visto…

DOUTOR CUKROWICZ: E era caso para isso, e até para perder a razão, se o seu filho pensava ter visto uma imagem de Deus nesse espectáculo a que assistiram nas Encantadas: criaturas do ar pairando e descendo sobre criaturas do mar, devorando as que tinham a pouca sorte de ter nascido em terra, de não ser suficientemente hábeis e rápidas rastejando até ao mar. Compreendo que tal espectáculo possa ser equacionado com vivência, experiência, sei lá… mas não com Deus! A senhora compreende?

SRA. VENABLE: Doutor Cukrowicz, embora membro razoavelmente leal da Igreja Episcopal Protestante, compreendi perfeitamente o que o meu filho quis dizer.

DOUTOR CUKROWICZ: Que nos devemos erguer acima do próprio Deus?

SRA. VENABLE: Não. Quis dizer que Deus nos mostra uma face hedionda e nos atira à cara palavras crueis. Que isso é tudo o que vemos e ouvimos dele.

(Tennessee Williams, Bruscamente no verão passado)

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