domingo, junho 26

Perguntas

Nos tempos heróicos em que havia classe operária a greve era um meio de pressão sobre a entidade patronal. Prejudicar a produção levaria os patrões a negociar.
Nas democracias modernas, a greve foi transformada num direito regido por leis. Na situação portuguesa do presente a greve é uma instituição claramente doente: na prática só é utilizada pelos trabalhadores que vivem directamente do orçamento do estado. Por conseguinte o sentido que a greve tem como confronto com a entidade patronal fica pervertido. Essa entidade é demasiado abstracta para que o confronto com ela seja a sério. O confronto é com os outros cidadãos, sejam eles utentes de escolas, transportes, hospitais ou repartições públicas. Normalmente são os mais pobres que saem prejudicados, a não ser em casos como o que poderia ter sido a greve aos exames: aí "comeriam" todos pela mesma medida (grande).

As iniciativas de greve dos sindicatos beneficiam, ainda assim, de uma ampla dose de simpatia entre as populações, como se vê pelo facto de estas tolerarem razoavelmente os profundos incómodos causados. Mas este estado de tolerância pode ser desequilibrado pela insistência em atitudes afrontosas e de claro desprezo por quem é a razão de ser do trabalho de um grupo profissional (caso dos exames...). Ainda mais quando o cidadão comum, menos privilegiado em termos de situação laboral que os do dito grupo, encara as reivindicações subjacentes ao protesto como manifestação de arrogância e futilidade.

Parece que a próxima investida, já anunciada por diversas vezes, é a dos juizes e magistrados. O protesto tem como motivo a questão dos dois meses de férias. Mas o que mais me choca neste caso está muito para além da circunstancial futilidade. Eu não compreendo como é que um órgão de soberania pode fazer greve. Então os juizes e magistrados não são independentes? Não respondem apenas perante eles próprios? Não estão ao mesmo nível que o Governo, a Assembleia da República e o Presidente da República? Os membros do Governo e da Assembleia também poderão um dia organizar-se em sindicatos e embarcar em greves? A quem se dirigirá então a ameaça de confronto?

1 comentário:

Nino disse...

Os nossos parlamentares estão em greve permanente. Quando se cansam, lá legislam algo que nos concerne de facto.