segunda-feira, outubro 31
Os casos da vida real: um problema de sentido
Independentemente da justiça formal, as pessoas comuns elaboram, sobre os casos de notícia, os seus juízos de acordo com as intuições próprias, com o "senso comum" (tantas vezes invocado nas actas dos julgamentos como suporte à convicção do tribunal). O caso Duarte Lima, embora com a peculiaridade de envolver um crime de sangue, portanto de natureza especialmente grave, tem uma característica comum com casos recentes que envolveram figuras políticas nacionais de destaque em actos que somos levados a entender como de corrupção, alguns dos quais com investigação incompleta ou interrompida. Essa característica tem uma natureza muito simples e milita contra os susceptíveis de suspeita. Trata-se do facto de a peça acusatória - ou, nos casos referidos, os elementos que foram dados a conhecer publicamente - encerrarem uma coerência e um sentido que são difíceis de rebater. (Ainda mais no caso DL, por ter sido objecto de investigação aprofundada.) Daí a ineficácia, perante a opinião pública, das vagas desculpas até agora dadas em todos os casos. Seria preciso encomendar ao melhor argumentista de policiais um enredo credível para substituir a versão que corre. Tarefa gigantesca, porque o real não se deixa bater facilmente pela ficção. Quanto aos juízos prévios sobre o carácter pessoal, a vida mostra que pouco valem. Assassinos cruéis são frequentemente descritos, com imensa surpresa, por vizinhos e conhecidos, como "boas pessoas".
domingo, outubro 30
Problema de aritmética
Este problema passa-se em França. Suponhamos que vamos contratar 60 000 professores ao longo de 5 anos, à razão de 12 000 por ano. Sabendo-se que o salário bruto com encargos ronda os 40 000 euros anuais, quanto se gasta no 1º ano? Em números redondos à volta de 500 milhões. Qual é o custo da medida ao fim dos cinco anos?
O problema é neste momento tema de um debate inflamado. Isto porque Hollande, o candidato do PS à presidência, e autor da ideia, afirmou que o custo iria ficar pelos 2,5 mil milhões. Chatel, ministro da educação, chamou a atenção para um "pequeno" erro de cálculo e observou que o custo afinal andará pelos 7,5 mil milhões. De resto, já alguém dentro do PS se tinha apercebido de que alguma coisa não batia certo: Michel Sapin tinha-se apressado, a seguir ao anúncio de Hollande, a precisar que os 60 000 postos não eram bem assim, e seriam parcialmente conseguidos com supressão de outros dentro da função pública. O que também não deve ter animado muito.
O lado mais divertido desta discussão é que a fé ideológica inibe o bom senso e desencanta os mais inesperados argumentos para contrariar as leis da aritmética.
O problema é neste momento tema de um debate inflamado. Isto porque Hollande, o candidato do PS à presidência, e autor da ideia, afirmou que o custo iria ficar pelos 2,5 mil milhões. Chatel, ministro da educação, chamou a atenção para um "pequeno" erro de cálculo e observou que o custo afinal andará pelos 7,5 mil milhões. De resto, já alguém dentro do PS se tinha apercebido de que alguma coisa não batia certo: Michel Sapin tinha-se apressado, a seguir ao anúncio de Hollande, a precisar que os 60 000 postos não eram bem assim, e seriam parcialmente conseguidos com supressão de outros dentro da função pública. O que também não deve ter animado muito.
O lado mais divertido desta discussão é que a fé ideológica inibe o bom senso e desencanta os mais inesperados argumentos para contrariar as leis da aritmética.
sábado, outubro 29
Lisboa fora de horas
A notícia caiu como uma bomba para o Presidente da CML. Todos os jornais dizem mais ou menos isto: o Presidente considera que encerrar o metro à noite é um disparate. De acordo com todos os relatos há dois motivos principais para a irritação do auto-arca. Primeiro, soube da coisa pelos jornais. Segundo, é impensável prejudicar a movida esfuziante do Bairro Alto, Alcântara e Santos ao fim de semana. Não sabemos se o senhor também está preocupado com quem tem um trabalho nocturno e precisa de ir dormir a casa durante os dias laborais. Certo que a movida e o transporte de jovens já era preocupação sua em 2007. Os grandes problemas merecem, naturalmente, a atenção dos nossos dirigentes. Mas atendendo a que muitos locais do gozo nocturno só animam lá para as duas da manhã e se mantêm em actividade tórrida até ao despontar do sol, um pouco de reflexão mostrará que não há problema. É preciso é evitar que o governo mande fechar o metro de manhã aos sábados e domingos. É para aí que é necessário apontar as baterias.
terça-feira, outubro 25
A insustentável leveza de certo pensamento
Discutiu-se muito nos últimos dias sobre se Kadhafi teria sido executado. Em alguns círculos ansiava-se pelo resultado da autópsia. Entretanto, as fotos e videos já circulavam na net. O El Mundo descrevia há dois dias pormenores de calafrio, que incluiram sodomização com estacas. As versões mais depuradas falam de uns puxões de cabelo e tiros. Mau fim para o homem que há quatro anos montava a sua tenda nos ocidentais parques, onde era recebido com grandes mostras de hospitalidade.
Depois tivemos a peregrinação ao frigorífico onde o cadáver foi colocado, mostrada nas televisões, e finalmente o anúncio de uma espécie de Primavera dos Islamistas feito pelo homem forte do Conselho Nacional de Transição.
Como é que aqueles que designamos como intelectuais vêem tudo isto? Bernard Henry Lévy, cujas últimas intervenções de relevo na esfera pública foram o apoio a Sarkozy para intervir militarmente na Líbia e a defesa de DSK classificando o episódio de Manhattan como armadilha montada por uma femme de chambre, comoveu-se ontem por escrito com o que lhe parecia até agora uma insurreição quase exemplar. O choque começa com a revelação da careca do defunto tirano, que "nos habituáramos" a ver em turbante, e mesmo tentando rememorar as "nossas" selvajarias paralelas (1979, Mussolini pendurado pelos pés, Ceausescu...) Henry Lévy não descansa. Diz ele que este pode ser o ponto de viragem em que as coisas começam a resvalar para o lado oposto. Romântico como se confessa, termina dizendo-se convencido de que tudo vai acabar bem.
Há surpresas nisto tudo? Só as do próprio BHL. Quando o turbante nos não permite suspeitar de uma careca, tamém é natural que se confunda uma operação de guerra que envolve os aviõezinhos da NATO com uma insurreição pela democracia onde tudo está a correr bem.
Depois tivemos a peregrinação ao frigorífico onde o cadáver foi colocado, mostrada nas televisões, e finalmente o anúncio de uma espécie de Primavera dos Islamistas feito pelo homem forte do Conselho Nacional de Transição.
Como é que aqueles que designamos como intelectuais vêem tudo isto? Bernard Henry Lévy, cujas últimas intervenções de relevo na esfera pública foram o apoio a Sarkozy para intervir militarmente na Líbia e a defesa de DSK classificando o episódio de Manhattan como armadilha montada por uma femme de chambre, comoveu-se ontem por escrito com o que lhe parecia até agora uma insurreição quase exemplar. O choque começa com a revelação da careca do defunto tirano, que "nos habituáramos" a ver em turbante, e mesmo tentando rememorar as "nossas" selvajarias paralelas (1979, Mussolini pendurado pelos pés, Ceausescu...) Henry Lévy não descansa. Diz ele que este pode ser o ponto de viragem em que as coisas começam a resvalar para o lado oposto. Romântico como se confessa, termina dizendo-se convencido de que tudo vai acabar bem.
Há surpresas nisto tudo? Só as do próprio BHL. Quando o turbante nos não permite suspeitar de uma careca, tamém é natural que se confunda uma operação de guerra que envolve os aviõezinhos da NATO com uma insurreição pela democracia onde tudo está a correr bem.
sábado, outubro 22
A modéstia do tamanho normal
Para contrariar a mania dos franceses de viverem acima dos próprios meios, a Academia Nacional de Cirurgia adverte da inutilidade e dos perigos que podem estar envolvidos numa operação de alongamento do pénis. Ao mesmo tempo, para sossegar os homens do hexágono, acaba de publicar, há 3 dias, a tabela de dimensões normais do dito órgão. As medidas deixam muitos leitores na dúvida quando confrontam o seu caso com a norma, e são pretexto para alguns mostrarem que sabem distinguir entre diâmetro e perímetro da circunferência. Há toques de bom humor nos comentários.
terça-feira, outubro 18
Meio centenário
Em 18 de Outubro de 1961, WEST SIDE STORY estreou no Rivoli Theatre da U. A. em New York. A sala dispunha de condições técnicas e uma acústica excepcionais.
domingo, outubro 16
sábado, outubro 15
Efeitos colaterais da recessão
Diz aqui que que, de acordo com um estudo publicado no Journal of Experimental Social Psychology, os homens tendem a ser mais infieis sob a recessão. Há até uma moldura teórica em pano de fundo: a perspectiva de uma vida encurtada ou de menor sucesso desencadeia os mecanismos biológicos de sobrevivência por via da reprodução. Os cientistas chegaram a estas conclusões observando, entre outras engraçadas coisas, que homens induzidos a pensar na morte reagem com maior excitação a material pornográfico.
A recessão tem as costas largas. Permite ainda que se façam e publiquem coisas destas.
A recessão tem as costas largas. Permite ainda que se façam e publiquem coisas destas.
quinta-feira, outubro 13
Pouca sorte
Depois dos casos da Islândia e da Ucrânia, parece que vamos ter agora o da Hungria. Há ex-primeiros ministros com pouca sorte em o terem sido em determinados paises.
O ex-primeiro húngaro Ferenc Gyurcsány teve a sua imunidade parlamentar suspensa a noite passada. Vai assim ter de se apresentar à justiça sob acusações de corrupção. O "caso do casino" (assim é conhecido), em que há fortes indícios de uma troca de propriedades em condições gravosas para o estado húngaro, já tinha posto em cheque Gyurcsány durante o governo anterior, ainda socialista. A operação fora realizada com ultrapassagem do procedimento legal, e autorizada pelo ex-primeiro por ser "um projecto de importância nacional". Mas o actual primeiro ministro Orbán vai querer ir mais longe, responsabilizando Gyurcsány pelo alto nível de endividamento do país.
Na verdade está em marcha uma acusação mais vasta contra os três ex-primeiros socialistas, e a investigação preliminar, concluida no início de Agosto, aponta para "crime político contra a Hungria", onde a dívida disparou de 53 para 80% entre 2002 e 2010.
A oposição vai dar luta e, para já, diz que Orbán procura uma manobra de diversão porque não tem projecto para o país.
Sem surpresa, o primeiro ministro Orbán tem má imprensa. Os media main-stream olham-no como alguém que coabita mal com a democracia. Estou certo que há-de ser possível encontrar as preocupações da mesma imprensa quando os anteriores ministros socialistas gastavam à doida ou executavam operações de legalidade dúbia. Fica aqui a ideia para tema de uma tese de mestrado nalguma escola de jornalismo.
O ex-primeiro húngaro Ferenc Gyurcsány teve a sua imunidade parlamentar suspensa a noite passada. Vai assim ter de se apresentar à justiça sob acusações de corrupção. O "caso do casino" (assim é conhecido), em que há fortes indícios de uma troca de propriedades em condições gravosas para o estado húngaro, já tinha posto em cheque Gyurcsány durante o governo anterior, ainda socialista. A operação fora realizada com ultrapassagem do procedimento legal, e autorizada pelo ex-primeiro por ser "um projecto de importância nacional". Mas o actual primeiro ministro Orbán vai querer ir mais longe, responsabilizando Gyurcsány pelo alto nível de endividamento do país.
Na verdade está em marcha uma acusação mais vasta contra os três ex-primeiros socialistas, e a investigação preliminar, concluida no início de Agosto, aponta para "crime político contra a Hungria", onde a dívida disparou de 53 para 80% entre 2002 e 2010.
A oposição vai dar luta e, para já, diz que Orbán procura uma manobra de diversão porque não tem projecto para o país.
Sem surpresa, o primeiro ministro Orbán tem má imprensa. Os media main-stream olham-no como alguém que coabita mal com a democracia. Estou certo que há-de ser possível encontrar as preocupações da mesma imprensa quando os anteriores ministros socialistas gastavam à doida ou executavam operações de legalidade dúbia. Fica aqui a ideia para tema de uma tese de mestrado nalguma escola de jornalismo.
sábado, outubro 8
Post para maiores de 50
O US Preventive Task Force desaconselha as análises ao PSA. Porque não salva vidas e porque pode levar a intervenções clínicas que causam sofrimento e arruinam a qualidade de vida. Porque fica caro também, sabe-se lá.
Alguns urologistas não pensam o mesmo, mas há quem diga que eles só pensam em lucrativas cirurgias.
Os testemunhos de doentes não deixam ninguém tranquilo. Entretanto, podemos dizer, brincando para matizar expectativas cruentas, e de acordo com as nossas preferências, que os "paineis da morte" já aí estão; ou que finalmente alguém faz frente ao lobby da medicina que só só pensa em retalhar para enriquecer.
Alguns urologistas não pensam o mesmo, mas há quem diga que eles só pensam em lucrativas cirurgias.
Os testemunhos de doentes não deixam ninguém tranquilo. Entretanto, podemos dizer, brincando para matizar expectativas cruentas, e de acordo com as nossas preferências, que os "paineis da morte" já aí estão; ou que finalmente alguém faz frente ao lobby da medicina que só só pensa em retalhar para enriquecer.
domingo, outubro 2
Entretanto, no mesmo lugar...
Nas histórias de banda desenhada que lia há muitos anos atrás, a acção sofria frequentes deslocações espaciais que mantinham a tensão e enriqueciam a perspectiva. Podiam ser introduzidas pela legenda "Entretanto, noutro lugar..."
Nos media conformistas que temos, quase tudo é visto sempre do mesmo ângulo, com guião estereotipado.
Por exemplo, jornais e tvs vêm-nos distraindo com a doença de Chávez, enquanto algo mais se move na Venezuela.
Acusado de corrupção em 2005 pela justiça do país, Leopoldo López viu-se impedido de concorrer a eleições em 2008. O popular autarca de Chacao não desistiu de lutar e, não tendo sido condenado por qualquer crime, levou o seu caso ao Tribunal Inter-Americano dos Direitos Humanos. O TIADH decidiu a favor de López no passado dia 16 de Setembro: a proibição de se candidatar a cargos públicos deve ser levantada. Apesar de a decisão não ter sido ainda aceite pelos tribunais venezuelanos, López já se movimenta com apoio popular visível. O veredicto do TIADH e a determinação de Leopoldo López tornarão a vida mais difícil ao actual presidente. Para já, declara (entrevista de hoje no ABC) que pensa candidatar-se à presidência, abolir as leis inconstitucionais e reparar as confiscações do estado.
O comício de López em Chacaito, há uns dias atrás, é documentado aqui, com fotos e video, pelo Daniel.
sábado, outubro 1
A preciosa luz
Tratemos de apagar as luzes sempre que mudamos de sala, desligar todos os vorazes stand-by que infestam os apartamentos, encurtar os duches e banir os assados no forno. A partir de hoje pagamos mais pela energia. Vamos sentir até ao âmago da etimologia que a luz é um bem precioso. Se vivêssemos no país aqui ao lado, poderíamos dispôr de um descontozito no recibo durante o trimestre que falta até ao fim de 2011. Está bem que isso fará disparar o défice tarifário em Espanha em 2012, e que as empresas do sector se queixam da política energética do governo, mas o que interessa é que em Novembro há eleições por lá.
A energia é, de resto, uma fonte inesgotável de inspiração para os criadores de impostos. Para defender o planeta, os nossos pulmões (atenção, cidadãos movidos a gasóleo) ou o que quer que seja.
(Foto extraída de news.cnet)
A energia é, de resto, uma fonte inesgotável de inspiração para os criadores de impostos. Para defender o planeta, os nossos pulmões (atenção, cidadãos movidos a gasóleo) ou o que quer que seja.
(Foto extraída de news.cnet)
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