O Governo mostrou nos últimos dias intenções de actuar e mudar coisas. Os campos de intervenção escolhidos foram o do ensino da matemática (curiosa peculiaridade nacional) e o da justiça. Não me considero suficientemente dentro do assunto para comentar as medidas anunciadas para a justiça, embora me pareçam coisas pequenas que talvez não justifiquem o destaque que lhes foi dado. Em relação aos problemas com a matemática, sou um observador melhor posicionado. Por isso mantenho uma reserva pessimista até ver o que se vai passar de concreto. As iniciativas prometidas podem ser positivas, mas quando vão produzir efeitos? É bom saber que a ministra está preocupada com a formação dos professores do 1º ciclo do básico em funções. Mas estou curioso de saber duas coisas: a primeira é em que moldes e com que programas vai ser feita a formação; a segunda é como vão ser os professores no activo motivados (forçados?) a frequentar essa formação.
Nas acções em vista irão ser envolvidos departamentos de matemática universitários e outras instituições: tudo bem, mas tratando-se de acções ad hoc que requerem um desenho próprio, quantas discussões serão necessárias antes de as coisas poderem arrancar? Haverá a coragem de confiar a leccionação a professores do secundário ou 3º ciclo escolhidos de acordo com a sua competência científica e pedagógica?
E irá o resultado dessas acções ser aferido por avaliação credível, e terá esse resultado consequências nas carreiras de onde, como se sabe, é quase impossível arredar alguém? (Convém não esquecer que de acções de formação tem andado este inferno cheio há décadas.) Por outras palavras, receio que estas medidas, que seria importante terem reflexos a curto prazo, possam vir a reduzir-se a um modelo gasto e praticamente inútil. E, sabendo-se como nos últimos dez anos os ministérios da educação (PSD, PS) têm vindo a publicar textos inacreditáveis a que chamam "programas de matemática oficiais" (refiro-me aos do secundário) é pertinente ter dúvidas sobre o que nos espera.
Depois há ainda a considerar que nem a mobilização dos professores vai estar garantida: apesar de haver muitos com horário zero ou reduzidos, os sindicatos já tiveram a lata de vir mencionar que não há condições para pôr em prática alguns dos objectivos...
Não quero dizer que não se avance com estas medidas. Espero que venham a ser realizadas com o sucesso possível. Mas julgo que seria muito mais eficiente, no curto prazo, dar um sinal de rigor mantendo os exames externos no 9º ano e não anunciando a sua extinção.
NOTA. O Bom Senso observa, com razão (a propósito do inquérito sobre a tabuada, na sic) que saber matemática é muito mais do que saber a tabuada. Mas desconhecer em alto grau a tabuada não ajuda muito a avançar no estudo da disciplina. É importante criar familiaridade com os números, a sua ordem de grandeza e as relações entre eles. É igualmente importante desenvolver a capacidade de utilizar automatismos que acabam por nos economizar tempo ao elaborar raciocínios complexos. As ideologias pedagógicas em moda têm desvalorizado muito estes aspectos na aprendizagem, com resultados negativos evidentes.
sábado, abril 30
quarta-feira, abril 27
Matemática II
Ouvi há pouco a ministra da educação na SIC. Das medidas a que se referiu há uma que me parece fazer sentido: melhorar a formação de professores do ensino básico (1º ciclo) que, como é sabido, podem estar a ensinar sem ter tido formação em matemática. Parece que tenciona confiar a tarefa às ESEs. Não sei se a ministra está a par da ideologia pedagógica que impregna uma parte considerável das ESEs e, consequentemente, da possibilidade bem real de, após levada a cabo a iniciativa, as massas estudantis continuarem a entupir quando lhes perguntam quanto é 6x7, 6x8 ou 6 ao quadrado (como a SIC mostrou, há pouco mais de uma hora).
A Matemática só nos dá preocupações
A ministra que acha que os exames no 3º ciclo do básico são uma coisa execrável, e por isso devem ser extintos, está preocupada com as más prestações dos alunos em Matemática. Para isso, propõe uma série de medidas originalíssimas. De modo também originalíssimo, a presidente da Associação de Professores de Matemática vem dizer que está de acordo, mas.
segunda-feira, abril 25
Livros e leituras
O O.N. (Prozacland) desafiou-me a responder a um inquérito que, como me apercebi, tem circulado na net nas últimas semanas. Eu não consigo responder porque acho que a primeira pergunta está mal formulada, e a partir daí creio que tudo perde o sentido. Mas, sem ser uma resposta, posso dizer que o último livro que li foi o Traité des Excitants Modernes de Balzac. E o penúltimo foi a Memória das Putas Tristes do... vocês sabem quem. E o antepenúltimo foi Un Amour de Jeanne de Michel Ragon. De momento entretenho-me com os textos de El Lenguaje de la Pasión, de Vargas Llosa (2000). E quando olho para a pilha de livros em fila de espera hesito sempre entre iniciar um novo ou reler um daqueles que me surpreenderam ou maravilharam. Até agora a escolha tem sido quase sempre a primeira, mas também é verdade que não têm sido poucas as leituras que deixo incompletas: umas vezes porque decididamente a qualidade não satisfaz, mas em grande parte dos casos porque me apercebo de que "já li aquilo noutro lugar" - no sentido em que intuo que prosseguir a leitura não me vai proporcionar prazeres novos. E, sendo sabido que tenho falta de tempo, sou obrigado a economizar este mais escasso dos bens.
Haverá vida inteligente no Instituto da Inteligência?
(via Blasfémias, link ao lado:) Esta curiosa notícia suscita dúvidas muito pertinentes. Os progressos na educação vão dar passos de gigante, dizem eles! Presunção e água benta...
quarta-feira, abril 13
A ANTENA 2
A Antena 2 é um luxo. Uma estação de rádio que emite sobretudo música de qualidade 24 horaspor dia! (Com os acontecimentos deprimentes do dia, como as manifestações de estudantes amestrados, não tenho outro remédio senão pensar em coisas insignificantes como a Antena 2.) Dizia eu que nem sabemos dar o verdadeiro valor ao tesouro que é a A2 e que nos dão de bandeja. Bom, mas nem tudo é exactamente assim bom, preto no branco. É que além da música há por lá umas pessoas que falam! Claro que ouvir uma boa conversa é um prazer, e ocasionalmente issso consegue-se (cada vez menos). A rádio portuguesa está cheia de conversa de chacha (será com x? só conheço a palavra pela oralidade) e a A2, ao contrário do que poderia pensar-se, não é excepção. Os animadores dos programas mais informais (Despertar a 2 e Ritornello, por ex.) ou falam demasiado, sem conteúdo que se oiça, ou exibem fraquíssima capacidade de articulação de um discurso interessante, ou limitam-se a tentar inocular-nos doses maciças de gostos pessoais e entrevistas a amigalhaços irrelevantes. Quando oiço aquelas conversas insípidas e trôpegas, como a desta manhã no início do Acordar (gerando um impulso para desligar o rádio apesar da alta qualidade da música que estavam a passar) ocorre-me sempre como é frequente andarmos no mundo com os papéis trocados. Quem estaria bem na A2 seria o António Guterres. Pelo menos as frases sairiam direitinhas e com sintaxe irrepreensível, eventualmente com arquitectura requintada. E ali não prejudicaria o país nem o mundo. O auditório da A2 deve caber numa sala pequena do CCB.
domingo, abril 10
No PÚBLICO de hoje...
Guilherme Valente, preocupado com o que irá ser a política de educação no curto prazo. Assino por baixo. António Barreto escreve sobre os dilemas do PSD.
Ana Sá Lopes, que às vezes tem piada no papel de Vanessa, hoje espalha-se ao comprido. É que só se pode continuar a ridicularizar Santana Lopes por preguiça intelectual.
Ana Sá Lopes, que às vezes tem piada no papel de Vanessa, hoje espalha-se ao comprido. É que só se pode continuar a ridicularizar Santana Lopes por preguiça intelectual.
sábado, abril 9
O nome e o prenome
Em Portugal cultivamos um uso exorbitante de títulos académicos. Digo exorbitante porque é com grande frequência que, em situações que não têm a ver com a vertente profissional associada, precisamos do dr. ou eng. para referir determinada personagem pública do mundo da política. Até os sarcásticos, pessimistas e impiedosos críticos do nosso pequeno mundo caem no vício: Vasco Pulido Valente escreve frequentemente "dr. Cavaco". O vírus da doutorite-engenheirite é transversal na nossa sociedade, mas os jornalistas constituem claramente um grupo de risco com elevado potencial de infecção. (E até os ouvintes do forum da TSF chamam por vezes "dr..." ao jornalista de serviço!)
Um momento de reflexão basta para nos darmos conta de que nunca ouvimos as expressões dr Blair ou dr Chirac ou dr Aznar ou eng Zapatero ou...
Provincianos e pequeninos, julgamos que tratar alguém, fora de uma situação profissional em que isso se justifique, por "senhor" ou "senhora", é sinal do desprezo e sobranceria com que nos dirigiríamos ao canalizador ou ao marido da nossa empregada doméstica (pessoas que, de resto, podem ser competentíssimas nas respectivas profissões).
Quando todos acharmos natural dizer e escrever "sr. Cavaco", "sr. Sócrates" ou "sra Ana Gomes" teremos feito progressos no domínio das nossas próprias referências.
Um momento de reflexão basta para nos darmos conta de que nunca ouvimos as expressões dr Blair ou dr Chirac ou dr Aznar ou eng Zapatero ou...
Provincianos e pequeninos, julgamos que tratar alguém, fora de uma situação profissional em que isso se justifique, por "senhor" ou "senhora", é sinal do desprezo e sobranceria com que nos dirigiríamos ao canalizador ou ao marido da nossa empregada doméstica (pessoas que, de resto, podem ser competentíssimas nas respectivas profissões).
Quando todos acharmos natural dizer e escrever "sr. Cavaco", "sr. Sócrates" ou "sra Ana Gomes" teremos feito progressos no domínio das nossas próprias referências.
quinta-feira, abril 7
Mau tempo na educação...
... com o abandono do objectivo de validar os manuais escolares por alguns anos. E com o anúncio da supressão dos exames no 9º ano.
segunda-feira, abril 4
POSITIVO NEGATIVO
Há poucos dias foi distribuída com o Público uma revista intitulada País Positivo. Uma primeira parte era dedicada a 2005 ano internacional da Física e era pretexto para umas fotografias de presenças de Sampaio em sessões relacionadas com o evento. Havia também uma entrevista com o presidente da FCT, Ramoa Ribeiro. Seguiam-se páginas dedicadas a publicidade de empreendimentos turísticos. A terminar, entrevistas com vários autarcas focavam as suas grandes iniciativas no sentido do progresso das regiões onde são poder.
Sabem como se fazem estas revistas? Os promotores enviam propostas aos potenciais interessados em publicidade, juntamente com a tabela de preços. Quem quer ser "entrevistado" paga.
Trata-se de pura publicidade mascarada de jornalismo. Honestamente, que interesse pode suscitar este tipo de publicação? Para além da sensaboria do objecto há um aspecto que me desagrada: saber que é com dinheiro público que alguns empoleirados vêm anunciar as suas grandiosas realizações (estou a pensar sobretudo nos autarcas).
Há poucos dias foi distribuída com o Público uma revista intitulada País Positivo. Uma primeira parte era dedicada a 2005 ano internacional da Física e era pretexto para umas fotografias de presenças de Sampaio em sessões relacionadas com o evento. Havia também uma entrevista com o presidente da FCT, Ramoa Ribeiro. Seguiam-se páginas dedicadas a publicidade de empreendimentos turísticos. A terminar, entrevistas com vários autarcas focavam as suas grandes iniciativas no sentido do progresso das regiões onde são poder.
Sabem como se fazem estas revistas? Os promotores enviam propostas aos potenciais interessados em publicidade, juntamente com a tabela de preços. Quem quer ser "entrevistado" paga.
Trata-se de pura publicidade mascarada de jornalismo. Honestamente, que interesse pode suscitar este tipo de publicação? Para além da sensaboria do objecto há um aspecto que me desagrada: saber que é com dinheiro público que alguns empoleirados vêm anunciar as suas grandiosas realizações (estou a pensar sobretudo nos autarcas).
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