terça-feira, agosto 11

Teoria da literatura de praia


Nem só o Correio da Manhã, a Bola e o Record são lidos na praia. O expositor de livros é imenso ao longo do areal, e mesmo com um olhar distraído fico a saber que há títulos que de outro modo não me chamariam a atenção. Não tenho dados fiáveis, mas diria que este verão o top das leituras vai para a rapariga no comboio.

É provável que o "policial" tenha um atractivo especial. O que um leitor pretende é que lhe contem histórias, e o mistério que envolve um crime confere ao conto o picante procurado.

Há dias atrás gostei do título "A verdade e outras mentiras", exibido com destaque num expositor, e comprei o livro sem me aperceber de que estava na categoria dos policiais. Não vou lamentar-me, não: foi um passatempo interessante, mesmo que desde cedo fosse visível uma certa artificialidade do enredo. A narrativa é leve, como convém, por vezes pontuada por uns ditos que oscilam entre um bom achado, o bem humorado, e o mau gosto gratuito. Sem surpresas, o livro comporta-se mais como um eficaz script para tv ou cinema do que como uma novela de qualidade.

Qual é a distância entre esta "verdade e outras mentiras" e um livro fascinante? Para além da inverosimilhança exibida sem cerimónia (por vezes parece que estamos a ler as versões que os autores de delitos compõem para se justificarem), confiar ao narrador omnisciente aquele entramado todo só pode reforçar a impressão de que tudo se vai desenrolando com a ajuda de uns truques e toques de magia. Há uma personagem má (o protagonista), o que é bom, mas não mau a tempo inteiro, o que é mau; a Martha, coitada, não tem credibilidade, e o perseguidor Fasch é pouco mais que redundante.

O criminoso sabe, e repete, que é necessário um cuidado imenso para não deitar tudo a perder por algum detalhe ou partida do acaso. É esse toque de realidade que falta na novela: mesmo que o mau escape sem castigo, o leitor prefere que ele tenha estado em muito maior risco de se perder. Apesar de tudo, o livro entretém e fica bem em qualquer biblioteca à beira mar.

Post scriptum: A internet está cheia de recensões entusiásticas que o livro, quanto a mim, não merece. A crítica mais certeira encontrei-a no Cabaret Bizanzio.



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