sábado, outubro 6

Matemática para o ensino básico: um programa e muito mais

Terminou a "discussão pública" do "reajustamento" do programa de Matemática para o Ensino Básico. Significa isto que uma comissão andou a redigir uma proposta e que algumas pessoas e grupos deram a conhecer ao Ministério da Educação as suas palmas ou assobios a esse respeito. Depois, feitas no esboço modificações insignificantes para que se possa dizer que houve discussão e consenso alargado, haverá um programa homologado e, na melhor das hipóteses, tudo continuará na mesma: quero dizer, vai haver maus resultados em Matemática como é costume, e o Ministério procurará combatê-los com engenharias avaliativas.

O programa de Matemática enumera os tópicos da disciplina que devem ser ensinados e aprendidos. Não o faz com grande auto-exigência de rigor e conexão (ao contrário do que pede aos estudantes, que devem "compreender como as ideias matemáticas se inter-relacionam e se apoiam umas nas outras constituindo um todo coerente" (pág. 8)), mas daí não decorre qualquer desastre. O resultado da aprendizagem está, em última análise, nas mãos de um punhado de bons professores, que ainda existem. Seria óptimo que houvesse programas bem estruturados e bem redigidos, mas mesmo a partir de um mau programa é possível escrever bons manuais e dar boas aulas.

O problema, com este e suponho que com programas de outras disciplinas, é o excesso de coisas que lá se dizem. Desde que os "especialistas em educação" passaram a ter voz de comando na produção destes documentos, os chamados "programas" economizam em qualidade científica e pedagógica o que esbanjam em indicações metodológicas espartilhantes, teorização barata e chavões repescados por copy-paste de teses, relatórios e outros documentos: de há uns anos para cá, sempre que sai um novo "programa", temos a sensação de estar sempre a ler a mesma coisa.

Este aspecto poderia ser inócuo, mas não é. O "programa" assume-se como primeiro elemento de um big brother que emana do ministério e pretende vigiar com suspeita minúcia a actividade do professor ("Trabalhar apenas com dízimas infinitas periódicas cujo período tem no máximo três algarismos.", p. 55). A desorientação que o palavroso texto é susceptível de provocar a qualquer professor menos seguro, ou que não tenha suficiente sentido de humor para sorrir ao lê-lo, é coerente com os variados procedimentos absurdos a que a vida na escola actualmente obriga os docentes, transformando-lhes a profissão num pequeno inferno.

Repare-se, a título de exemplo, na insistência com que está escrito que os alunos devem desenvolver

capacidade de abstracção e generalização e de compreender e elaborar uma argumentação
matemática e raciocínios lógicos;
capacidade de comunicar em Matemática, oralmente e por escrito, descrevendo, explicando e justificando as suas ideias, as estratégias e procedimentos que utiliza e os raciocínios, resultados e conclusões a que chega (p. 5);

acompanhar e analisar um raciocínio ou estratégia matemática.
descrever e explicar, oralmente e por escrito, as estratégias e procedimentos matemáticos que utilizam e os resultados a que chegam oralmente e por escrito, descrever a sua compreensão matemática, os procedimentos matemáticos que utilizam, e explicar a sua argumentação (p7)

desenvolver e discutir argumentos matemáticos (p8)


e mais à frente repisa-se que os alunos devem

Ser capazes de resolver problemas, raciocinar e comunicar em contextos numéricos(p.16)
Ser capazes de resolver problemas, raciocinar e comunicar recorrendo a representações simbólicas(p.47)
Raciocinar matematicamente, formulando e testando conjecturas e generalizações, e desenvolvendo e avaliando argumentos matemáticos relativos a resultados, processos e ideias matemáticos;
Comunicar oralmente e por escrito, recorrendo à linguagem natural e à linguagem matemática, interpretando, apresentando e discutindo resultados, processos e ideias matemáticos (p. 50)


e, não vá alguém esquecer-se, recorda-se que os alunos devem ser capazes de

Explicar e justificar os processos, resultados e ideias matemáticos.
Apresentar ideias e processos matemáticos, oralmente e por escrito, usando a notação, simbologia e vocabulário próprios (p. 52)

Raciocinar matematicamente, formulando e testando conjecturas e generalizações, e desenvolvendo e avaliando argumentos matemáticos incluindo cadeias dedutivas;
Comunicar oralmente e por escrito, recorrendo à linguagem natural e à linguagem matemática, interpretando, apresentando e discutindo resultados, processos e ideias matemáticos (p67).


É claro que muitas das recomendações lá escritas, mesmo quando têm em vista um mundo ideal que não existe na grande maioria das escolas, são bem intencionadas. O problema é que ou são irrealistas ou não valia a pena escrevê-las. Qual é o professor de Matemática dotado de bom senso que precisa de que lhe digam, por exemplo, que

promover o raciocínio e a comunicação matemáticos(...) constituem também importantes orientações metodológicas para estruturar as actividades a realizar em aula (p11) ?

1 comentário:

Anónimo disse...

Quero encontrar um programa onde posa resolver problemas de matematica , exemplo, eu coloca uma equação do 2º e ele resolve para mim. Mostrando os caminhos, tem algo parecido?